sexta-feira, 17 de maio de 2024

HÍGIDO

HÍGIDO


Em estado de pleno bem estar, 

Caminho para os altos neblinados.

Vibrando, em batimentos compassados,

O coração no peito a cada arfar.


N’uma trilha escarpada, sem parar,

Avanço d’olhos fitos sobre os prados,

Que s’estendem nos verdes ondeados

Do mar de morros baixos do lugar.


As pernas me obedecem o árduo esforço,

Embora ainda escorram pelo dorso

Em bicas tanto o suor quanto o sereno.


Exausto já — porém, mais bem disposto;

Eu sigo para o topo só por gosto

De ser ao céu imenso tão pequeno.


Brumadinho - 11 02 2024

quinta-feira, 16 de maio de 2024

DESENCONTRADOS

DESENCONTRADOS


Ao atar e desatar de nós, a vida

S’enredou uma trama previsível.

O amor, por fim, tornou-se algo risível

Como qualquer mania descabida.


Semelhante à chegada é a partida,

Meio à névoa no porto do impossível…

Meus olhos marejados creem plausível

Que a própria fuga em si seja a saída:


Na direcção oposta que seguiste

Eu dei rumo a meus passos na esperança

De deixar no passado quanto existe.


E enquanto na distância a gente avança,

Nem sei mais dizer se alegre ou triste

A imagem que te trago na lembrança.


Betim - 15 05 2024


segunda-feira, 13 de maio de 2024

MOTO-CONTÍNUO

MOTO-CONTÍNUO


Talvez eu seja apenas mais um tolo,

Incerto se engano a mim ou a toda gente.

Como quando em contínuo indiferente

A água no sobe-desce do monjolo.


Se face à gravidade não há dolo,

Tampouco o movimento é inocente:

O ciclo se repete tão-somente,

Em seu trabalho infindo do alto ao solo.


Assim, também a vida como a vivo

Segue com precisão de mecanismo

As alturas e as baixezas do egoísmo.


Mas leve é meu esforço… Algo furtivo

— Ignoro se ao começo, meio ou fim —

Que s'enche e s’esvazia dentro em mim.


Betim - 13 05 2024


sexta-feira, 10 de maio de 2024

MALEDICÊNCIAS

MALEDICÊNCIAS (gazel)


Passo e vejo do outro os tormentos,

Imerso em descontentamentos:


— “Sem sentimentos; sem sofrimentos.” —

Nos diz quem sentiu e sofreu…


Traz seus — dir-se-ia — argumentos,

Em face do que aconteceu.


Maldiz a vida por momentos,

Que anos de dor lhe concedeu:


— “Que sou senão esquecimentos 

Na mente de quem me conheceu?” —


Maldiz tudo e todos aos ventos

E a quem der tento ao brado seu:


— “Que sou senão meus desalentos,

Em face de quem m'esqueceu?” —


No mais, falava aos elementos 

Como a quem lhe desentendeu:


— “Que sou senão os maus intentos

De quem, egoísta, me perdeu. —


Parecia ler meus pensamentos…

Nem sei se era ele ou se sou eu!


Betim - 10 05 2024


terça-feira, 7 de maio de 2024

POR ALGUNS INSTANTES

 POR ALGUNS INSTANTES


Não sei se foste tu ou se fui eu

Quem se perdeu de nós ao nos perdermos.

Só sei que os dois partimos para os ermos,

Sem saber o que era meu e o que era teu.


Não sei dizer nem quando aconteceu

Isto de nos olharmos sem nos vermos…

Incertos do contexto e até dos termos,

Eis a página que o azar nos escreveu:


Soltamo-nos as mãos meio ao caminho,

Como quem quer chegar antes ao fim

E andasse mais veloz porque sozinho.


Contudo, ao entardecer, pensas em mim.

E, por alguns instantes; sem carinho,

M’esperas vir por onde um dia eu vim.


Betim - 05 05 2024