terça-feira, 2 de dezembro de 2025

ARAUTO

 ARAUTO


Nunca faltar com a franqueza,

Eis do desditoso a desdita…

Quem traz verdades, traz tristeza

E sempre mais só se acredita.


Quem traz verdades se aflita...

No fim, toda a gente o despreza.

Eis do desditoso a desdita:

Nunca faltar com a franqueza!


Quem traz verdades se aveza

A manter uma aura maldita

Em face d’alheia tibieza…

Eis do desditoso a desdita:

Nunca faltar com a franqueza!


Betim - 24 11 2025

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

TERCEIRA PONTE

TERCEIRA PONTE

Era uma cidade que tinha mar.
Era uma saudade que tinha amor.
Era liberdade; era caminhar.
Era soledade: Um sol a se pôr.

Era somente ir para não chegar.
Era sozinho ir para onde mais for…
Era pôr fim para recomeçar:
Era secar as lágrimas... E o suor!

Era atravessar e s'enternecer.
Era o mais passado e era o porvir.
Era a própria vida no entardecer.

Era anonimamente inexistir...
Era se lembrar para s'esquecer
Era, por fim e apenas, ir e vir.

Vila Velha - 05 11 2009

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

A CASA DO MEU AMOR

A CASA DO MEU AMOR


Bananeiras no quintal,

Jabuticabeira em flor…

No jardim, um roseiral:

A casa do meu amor.


Uma porta e uma janela

Sempre abertas, sem pudor.

Ecoa ais de minha bela

A casa de meu amor.


Duas águas e varanda,

D'onde mira o sol se pôr.

N'alta serra, feliz se anda

À casa do meu amor.


Uma vida retirada

Onde a tarde tem sabor

De quitandas com coalhada!…

Em casa do meu amor.


Na cozinha, seu café

Fumegante de vapor…

Se tudo ali mais doce é,

Na casa do meu amor.


Sua alcova, por dossel,

Cortinado furta-cor…

Uma estrada para o céu

A casa do meu amor.


A sonhar entre lençóis,

Se lembre do meu calor:

Um sorriso de mil sóis

Na casa do meu amor!


Passo em frente, para vê-la,

– Tantas vezes? Quantas for! –

Namoradeira… À janela

Da casa do meu amor.


Lá, não se nota estranheza...

Não se rima amor com dor.

Não se fala de tristeza,

Na casa do meu amor.


Mas, se eu lhe faltar em vir,

Venham a ela em meu favor

Tais versos, por lhe sorrir,

À casa do meu amor.


Betim - 20 10 2010


segunda-feira, 27 de outubro de 2025

CAIXA DE FÓSFOROS

CAIXA DE FÓSFOROS


Não raro, escrever poesia 

é como tentar manter acesso um fósforo 

na escuridão.


Betim - 27 10 2025

terça-feira, 21 de outubro de 2025

ILETRADO

ILETRADO


Minha pouca leitura e entendimento

Têm feito de mim um poeta menor.

Ignoro se o que escrevo tem valor,

Deixando-me levar pelo momento.


Não cuido se coerente o pensamento

Ou mesmo se a meus versos dou sabor.

Se haveis prazer ao lê-los, meu leitor,

É antes vosso belo e bom intento.


Não sou de disputar co’os mais doutos,

Sim de me isolar em valhacoutos,

Como quem foge aos erros que engendrou.


Portanto, não me leais por cultura —

Vós que me pretendeis Literatura:

Têm as letras os males do que sou.


Sabará - 18 10 2025


terça-feira, 14 de outubro de 2025

IN THE PINES

IN THE PINES


Se, n'uma manhã, por neblina espessa,

Me aparecesse o rosto iluminado

D'aquela que viveu em meu passado

E se foi para os longes, quase à pressa…


Ela — sem tronco ou membros, só cabeça —

A vagar no vazio ensimesmado

Para estar, mesmo ausente, do meu lado

E manter, em maldição, sua promessa:


Sob os pinheiros, onde nunca o sol

Aquece o vão sombrio da montanha

E a névoa estende nívea o seu lençol,


Ali, com obsessão, o olhar s'embranha

E se confessa culpa estremecida,

Uma outra vez, na lágrima incontida.


Moeda Velha - 04 10 2025

terça-feira, 7 de outubro de 2025

OROGRAFIAS AFECTIVAS

OROGRAFIAS AFECTIVAS


Aquelas três corcovas alinhadas,

A maneira de irmãos para uma foto,

Cerram a cordilheira no remoto

Sítio onde o Paraopeba abre moradas.


Seguindo, d’Oeste a Leste, amplas cumeadas

— D’onde rolara a moça em tempo ignoto…

Além, ao velho Curral, por fim anoto:

“Da metrópole mineira, altas miradas.”


Caminhos de minério, cavas, vidas…

As montanhas s'elevam enternecidas

De serem fundo ao nosso quotidiano.


Eu as saúdo aos brados, de regresso,

E à vastidão silente lhes confesso

Meus ais de caminhante suburbano.


Moeda Velha - 04 10 2025