Espaço para exibição e armazenamento de poemas à medida que os vou escrevendo. Espero contar com o comentário de leitores atentos e gente com sensibilidade poética por acreditar que o poema acabado não precisa ser o fim de uma experiência, sim o início de um diálogo.
terça-feira, 31 de agosto de 2021
DOS MONTES
quarta-feira, 25 de agosto de 2021
SOBERANO
SOBERANO
Desamarelo,
o ipê perde as flores,
espalhando-as ao chão.
Resta a árvore seca e escura
contra o céu.
Assentada, todavia,
sobre um tapete imperial.
Betim - 24 08 2021
quarta-feira, 18 de agosto de 2021
RAPAZOLA
RAPAZOLA
Eu tinha dezessete; ela, trinta e tantos... Eu era virgem e ela sabia disso. Quando terminamos nossa primeira foda, ela me disse: -- "Rapazola, vou te ensinar as sacanagens!" Sacanagem, como todos sabem, tem dois sentidos. Evidente que ela m'ensinou ambos.
A partir d'aquela noite, tornamo-nos amantes. Eu a seguia como um cachorrinho na esperança de fodê-la outra vez. Contudo, ela era doutora na arte da enrolação. Na verdade, a coisa era complicada mesmo: Amásia -- não teúda e manteúda, mas chamego de mais de dez anos... -- ostentava de braço dado um bacana casado que vinha d'outra cidade vê-la de vez em vez. Em vista do que vivemos juntos, penso que folgava com forasteiros como eu para se distrair, feito mulher desimpedida. Eu, cabaço que era, nem acreditava finalmente estar com uma mulher que dava. Fazia doce, é verdade, mas dava.
Mesmo hoje, passado um lustro inteiro, ainda lembro em detalhes d'ela: Tinha olhos claros, puxados para verdes, onde a íris era d'um cinzento frio que lhe dava ares etéreos de deusa. Os lábios grossos beijavam nervosos e húmidos, com gosto. Sua pele, morena e apessegada, tinha aquela penugem descolorida que eu adorava eriçar.
Nua, porém, era uma força da natureza! Na primeira vez, despiu-se em pé, de costas para mim, revelando um curvilíneo tão formoso que me fez poetar: "Curvas mesmas de vespa a silhueta..." -- escrevi sobre ela anos após. De vera, tinha um par de nádegas inchadas sustentadas por pernas desproporcionais. Espetáculo! Ao virar-se, topei com seus seios grandes onde redondos onde as auréolas se inchavam e m bicos hirtos a concordar com a generosidade das nádegas rijas. Depois d'um sarro meio desajeitado (da minha parte, evidente) ela terminou de me despir, me sentou na cama e veio sobre mim. -- Rapazola! -- ordenou ela -- "Mete em mim!" Quando eu a penetrei é comecei a bombar nela, a danada soltou aquela frase que se diz para todos, mas que a gente finge que elas só dizem para a gente --"Que caralho mais gostoso!" -- Eu sorri e ela gozou.
Dia seguinte m'evitou. Saiu cedo do sítio onde eu fazia pousada e foi para a fazenda onde morava com o pai já velhinho. A irmã, muito parecida de rosto com ela, era casada com um moço que morava n'um casebre pr'os lados da rua, como chamam n'aquela parte do vale do Doce os vilarejos de casas e vendas aglomerados n'uma ou duas ruas. Coisa de distrito de quinhentos habitantes distante uns trinta quilômetros por estrada de chão até o asfalto. A irmã era a direita, diziam no lugar; quanto à minha, gostava d'uma história torta que só ela. Ambas estudaram magistério e eram professorinhas na escola do município. Davam aulas na sede também, apesar da lonjura, sendo reparadas como mulheres lindas, ambas, n'aquele grotão de meu Deus.
Digo que era amásia porque, embora trabalhasse, gozava d'um padrão de vida muito diferente de sua irmã: Sempre muito arrumada e perfumada, recebia às vistas de todos o seu caso vindo de carro esportivo, uma semana sim é a outra não. Os dois sumiam pelas cidades vizinhas...
Sem embargo, quando não estava com ele, atraía-me até a casa d'ela é ficávamos folgando juntos enquanto seu pai lidava com a roça. Tardes e tardes tépidas de saudosa memória... Era maravilhoso estar com ela. Pena fosse tão raro!
Foi como amante da amante que me coloquei n'aquele triângulo. Era uma posição cômoda, admito, visto que ela, ladina que era, jamais se demorava com ele na vila, de modo que nunca vi o moço senão de passagem dentro de seu carro com ela de carona evitando me olhar. Ela adorava me pôr esperançoso de vê-la, mas, uma vez empertigado à sua porta, percebia sempre sua casa cheia para que não pudesse me aproximar. Ainda assim trocávamos olhares, sorrisos, indiretas e até trança-mãos, ainda que na discrição segredada dos culpados que s'escondem para gozar. Eu, completamente encantando, dizia lhe querer mais do que o outro e que me casaria com ela se enfim o deixasse. Ela me olhava de volta com uma ternura sem medida, mas logo quebrava o enleio dizendo, com toda sabedoria do mundo, que nós dois não tínhamos futuro: -- "E como será d'aqui a cinco anos? E d'aqui a dez anos? Estarás jovem e eu, velha... Não suportarei me apegar e te perder assim. Prefiro não te ter de todo e tampouco ser toda tua!" -- concluía me mirando com olhos rasos d'água, mas firmes. Não havia argumento que lhe convencesse do contrário, embora hoje eu saiba que ela estava certa. Não era para ser. O amor "oiseau rebelle"
Cansado d'aquela enrolação sem fim, comecei a sair com uma colega dela, professora no mesmo grupo escolar. Nem de longe tinha o seu garbo... Para piorar, era crente é só daria para mim casando... Retraída, jamais cedia às minhas investidas de galo novo cheio de libido. A outra, a que realmente eu queria, olhava de longe aquele namoro rindo de mim com a certeza de que me levava para a sua cama quando bem entendesse. Certa vez, chegou a mangar de mim: "Vocês são dois fofos!" adivinhando que minhas investidas jamais abriam caminho por aquele decote pudico... Ela fazia questão de estar presente, angustiando-me com sua sensualidade, enquanto eu tentava manter o decoro diante de minha namoradinha... Era patético mesmo.
Quando fui embora d'aquela vila, certo de que jamais voltaria, nenhuma das duas me viu partir. Ainda se pegava carona no carro do leite então. Eu saí cedo, fui até o asfalto junto com os latões de leite, atravessei o rio Doce de canoa e peguei o trem Vitória-Minas para a Capital. Ainda trabalhei no vale do Doce mais uns três anos n'outras cidadezinhas, mas nunca voltei àquela para vê-la. Desde então, ela habita em meus sonhos, eternamente balzaquiana, sem envelhecer um dia, com o mesmo garbo que m'encantou quando eu era um rapazola. Quando eu era o seu rapazola.
Betim - 20 03 2020
segunda-feira, 16 de agosto de 2021
PLENA
sexta-feira, 13 de agosto de 2021
ÁGUA COM AÇÚCAR
ÁGUA COM AÇÚCAR
Embora fosse doce, uma bebida
Servida entre a fúria e o desespero.
Tal quem se medicasse um destempero
Deixando mais sangrar sua ferida.
Pelo álcool que lhe falta, mal se olvida
A angústia que em minh'alma reverbero:
Batendo em retirada do entrevero,
Atravesso outra noite mal dormida...
Engulo -- 'inda rescaldo ao fogo extinto --
O líquido a resfriar tantas paixões
Que arderam n'um sinistro quanto sinto.
Solução, tomo às pressas sem senões.
E enquanto me perdesse ao labirinto,
A beijos preferir sós ilusões...
Betim - 12 08 2021
quinta-feira, 12 de agosto de 2021
MALMEQUERES
MALMEQUERES
Não te odeio ao não me amares mais.
Talvez me odeie ao não mais ser amado...
Tampouco culpo a ti; antes o Fado
Por ainda te indagar d'estes meus ais!
E mesmo qu'eu quisesse, a ti jamais
Conseguiria odiar... Embora errado,
Mantive o coração esperançado,
A repetir promessas tão irreais...
Não! Não me amas mais... Eu sei. Eu sinto.
Se tanto t'esperei, é que me minto
Na crença de que um dia tu me amasses.
Foi tudo em vão: O amor passou por nós.
Pois, pétala após pétala, tão sós
Vivendo d'hesitantes desenlaces...
Betim - 06 01 2015
segunda-feira, 9 de agosto de 2021
EM FINS DE DEZEMBRO
EM FINS DE DEZEMBRO
Foram dias sem sol; noites sem lua,
Aqueles que, passado o Solstício,
Trouxeram-me o momento mais difícil
D'esta vida que apenas continua.
Horas e horas vagando pela rua
Tidas no bizarríssimo exercício
De rondar por beirais de precipício
A ecoar-me ganidos de dor crua.
Alheio a tudo e todos, andava eu
Às festas que costumam dar o povo,
N'um Natal em que nem Jesus nasceu...
Nenhum excesso mais eu me reprovo.
E, para esquecer quanto aconteceu,
Vou celebrar em vão outro Ano Novo!...
Guriri - 31 12 2020
sexta-feira, 6 de agosto de 2021
PONTO CULMINANTE
quinta-feira, 5 de agosto de 2021
AQUI E ACOLÁ
AQUI E ACOLÁ
Cá, dentro dos meus olhos, tudo está.
N'um mar de morros baixos pelas terras,
Ainda tu co'os ventos por mim erras
-- Poema d'amor e dor antigo já.
Lá! Para além do que há ou que haverá,
Por longes onde o céu azula as serras,
Do mundo n'estes altos te desterras
Até onde a mirada em fuga vá.
Pensando em ti há tempos tão distante,
Eu vivo minha vida entorpecido
Na espera de rever o teu semblante.
Entre cá e lá, luto contra o Olvido,
Descortinando do alto do mirante
As brumas que entre nós têm existido...
Belo Horizonte - 05 08 2021
quarta-feira, 4 de agosto de 2021
DESMOTIVACIONAIS
DESMOTIVACIONAIS (aforismas)
I
O verdadeiro perdedor é aquele que perde para si mesmo. Perder para outros melhores é ter sido superado, não insuficiente.
O topo é um lugar gélido, nebuloso, remoto e solitário onde ninguém consegue permanecer muito tempo.
Após outro fracasso redundante, faze como as cigarras: enterra-te n'um buraco para sair, no mínimo, vinte anos depois.
Resiliência não é tomar porrada na cara e manter-se de pé, mas sim cair e fingir-se de morto. Antes um covarde morto-vivo que um temerário vivo-morto.
Acostuma-te à poeira, quer bem ou mal sucedido. Todos a habitarão pela eternidade.
Tua mulher te abandona? Teus amigos te evitam? Teus filhos s'envergonham de ti? Eis a vida!
Repetes que o mundo está errado, quando na verdade teus erros são teu mundo...
Não te apresses nas carreiras da vida. Não há pódios nos subterrâneos.
Ser o maior não é o melhor. Ser o pior, tampouco. Sê o melhor para ti, ainda que debaixo da ponte.
Quem perde a direção e o sentido segue na resultante do acaso. Não somos todos guiados pela biruta dos ventos?
O coração dos outros é terra que ninguém vai -- dizem os antigos. Mesmo assim, seguimos buscando as ilhas semoventes do bem-querer!
Betim - 04 08 2021
segunda-feira, 2 de agosto de 2021
MERIDIONAL
MERIDIONAL
Desnorteado...
Desorientado...
Desocidentalizado...
Estou muito ao Sul
De tudo que é civilizado; religioso e lucrativo.
Estou muito ao Sul
Das Belas-Artes e da Alta Cultura...
Da Grande Literatura...!
À toa
Estou de boa
Deitado, dentro da canoa.
Ao Sul,
Ao céu azul!
Ao sol d'América do Sul.
Desnorteado...
Desorientado...
Desocidentalizado...
Sou do Sul.
Estou ao Sul; muito ao Sul...!
Betim - 02 08 2021