terça-feira, 12 de junho de 2018

CORDEL DA LUA DE SANGUE E DO SOL ENCARNADO - Segunda Parte: PROSÉLITOS

CORDEL DA LUA DE SANGUE E DO SOL ENCARNADO
Segunda Parte: 
PROSÉLITOS

Contudo, por toda parte
E com toda a espécie d'arte
S'elevaram muitas vozes
De líderes religiosos,
Que com libelos ferozes
Arvoraram-se os algozes
Dos erros pecaminosos.

Como se o braço de Deus,
Espevitavam os seus
Com ardor contra os demais,
Porquanto o mal manifesto...
Corrompida a Humanidade,
Eram eles, na verdade,
Dos homens santos um resto.

Arrastavam multidões
Em extensas pregações
A relembrar profecias
D'esses eventos finais.
Afirmando em gritarias
Ser aquele o fim dos dias
Face aos bíblicos sinais.

Havia, de facto, a imagem
-- No livro de Joel passagem
Dos oráculos do Senhor --
Contando a sua visão:
Onde um sol já sem ardor
Cede no céu seu fulgor
À mais plena escuridão

No lugar, tão-só a lua
Sem estrelas continua
A reluzir, contudo,
Plena e sanguínea no céu.
Indicando o fim de tudo,
Onde crentes sobretudo
Veem a desdita do infiel!...

Como Joel descreveu,
A lua em seu apogeu
Fez-se sanguínea também
E os céus não mais deixaria.
Somente um resto, porém
Reunido em Jerusalém
Com fé sobreviveria.

Os mais, perdidos nas trevas,
Co'as suas paixões malevas
Vendo os crentes verdadeiros
Livres de tão triste sorte
Onde desastres inteiros
E, ao fim, quatro cavaleiros:
Peste, guerra, fome e morte.

Após a última trombeta,
A cristandade completa
Veria o instante esperado
Só então, o crente fiel
Com Jesus ressuscitado
É também arrebatado
A ir ter com Deus no céu.

Aos que ficam -- diziam eles --
Resta a mesma a vida reles:
O mundo e sua injustiça
Permanece sem final.
Pois, onde o pecado viça
Na luxúria e na preguiça
Continua tudo igual!

A leituras desonestas
E tão obtusas quanto estas
É difícil contrapor,
Enfim o que quer que seja.
Se, para meu estupor,
Confundir mediante o horror
No fundo é o que deseja.

-- "Tendo fé como argumento,
A verdade é treinamento!" --
Eis como com inconstância
Um intolerante ensina
A sua própria intolerância
Àqueles que com grande ânsia
O veem igual lamparina...

Qualquer frase repetida
-- quer banal ou esclarecida --
Dogma virava em seus lábios.
Clamando em nome de Deus
Contra islamitas arábios,
Cientistas, artistas, sábios
E seculares ateus.

Tenho claro que tais falas
Ecoando por amplas salas
Tocam muitos corações.
Porém, são sobre política
E não sobre religiões...
A estes extensos sermões
Sempre falta autocrítica!

Mas as mensagens pastoras,
-- Autolegitimadoras!... --
Têm em comum entre si
O senso de que a Verdade
É a mesma aqui e ali,
A reluzir igual rubi
Para toda a Humanidade.

Em discussões cheias de nada
Tão-somente confirmada
A doutrina em seus enigmas
Deve ser por seus doutores...
Onde dogmas e querigmas,
De Jesus veem os estigmas
Ao celebrar-lhe louvores.

Assim, condenam o mundo
E o descrevem moribundo
À espera de seu final.
Em tudo vendo prodígios,
Já creem do bem contra o mal
A lua em sangue um sinal
Após guerras e litígios.

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