sexta-feira, 25 de abril de 2025

REFLEXOS

REFLEXOS


Veem d'onde se vem e aonde se vai.

De resto, sempre foi pelo poder

E à luz do que se deve ser ou ter:

Fidalguia do pai do pai do pai…


Indiferente já porque se trai,

A vidas em suspenso, diz: — ”A  ver…”

A bem da sanidade, deve crer

Que ao fim no esquecimento tudo cai.


“Se quanto consegui não me define,

Tampouco o meu fracasso diz de mim.”

— Filosofa ao encarar-se na vitrine.


Veem o que querem ver ou algo assim,

Mas segue sem que a angústia desatine.

No mais, não lhe parece bom nem ruim. 


Betim - 24 04 2025


terça-feira, 22 de abril de 2025

PROSCRITO

PROSCRITO


Se não surpreende a fúria dos perversos,

Tampouco a ingratidão dos infelizes.

Reste, de tudo, apenas cicatrizes

E ecos a distanciar uns ais dispersos.


Cumpra-se: Fora o poeta mais seus versos!

Erva daninha arrancada co’as raízes, 

Sirva de precedente a outros juízes,

Em paga de argumentos controversos…


Onde Judas perdeu as suas botas

Ou no fundo das mais profundas grotas,

Ei-lo lá, sorumbático e esquisito.


Em vão tentam dobrar o desvalido.

Ao fim, nem a distância nem o Olvido

Hão-de apagar o seu nome maldito.


Betim - 18 04 2025







quarta-feira, 16 de abril de 2025

A PERDER DE VISTA

A PERDER DE VISTA

No alto da grande serra, a imensidão.
Olho e vejo as montanhas na distância
E deixo o olhar perder-se pela errância
De quanto há de aventura ou solidão.

Perto demais do céu e preso ao chão,
Percebo sentir tal desimportância,
A ponto d’eu me ver sem arrogância,
Em face da vastíssima extensão.

Por artes de berliques e berloques,
Vim dar n’estas alturas desoladas
Até descortinar todo o horizonte.

Céus e terras azulam-se desfoques.
Miragens na miopia aquareladas,
Em tudo quanto vi além-defronte.

Brumadinho - 13 04 2025

sexta-feira, 11 de abril de 2025

SONOLÊNCIA

SONOLÊNCIA

D’olhos pesados, mal distingo o dia

A alvorecer por frestas de persiana.

Vem claridade ardendo-me a pestana,

Sem que inteiro desperte, todavia.

Tateio até o banho, cuspo à pia

E vejo a água sumir na porcelana.

Enquanto a mente enfim se desengana,

De quanto o sonho nutre a fantasia.

N’uma semiconsciência bocejante,

Preparo o meu café com pão dormido,

Mas sigo contra as luzes, relutante.

Ainda assim, o sol que ora invalido

Há-de me acompanhar, instante a instante.

E eis-me em péssimo humor amanhecido…

Betim - 10 04 2025


terça-feira, 8 de abril de 2025

INFECTOCONTAGIOSO

INFECTOCONTAGIOSO


Não me toques; retorna aos teus cuidados. 

Afasta-te de mim — tu que me amaste…

Fala que fui um vil e sou um traste;

Se vierem questionar, lembra passados…


Depois de tantos anos de desgaste,

Passe eu como errado entre os errados

Outro a viver senão de maus olhados

D’estes cuja honra têm em altiva haste.


Não negues a tua íris furta-cores

Luzir sobre boníssimos amores,

Por um que se conhece e após s’esquece.


Deixa-me retornar à escuridão 

— Tu que me foste amada… Na ilusão

De me lembrares só em tua prece.


Inhapim - 20 07 2011


POR GENTILEZA

POR GENTILEZA


Aquela que me tem no pensamento

Me olha com olhos ternos amiúde,

Como se me sondasse a solitude

Em resposta um pudico atrevimento.


Eu lhe saúdo e guardo o seu assento,

Talvez a parecer-lhe menos rude.

Mas tal proximidade não a ilude,

Enquanto inacessível me apresento.


Ela olha e nada vê de meu desejo

Mesmo que se pergunte como a vejo

Em sua primavera encantadora.


E, a pretexto de vaga polidez,

Posso tê-la comigo uma outra vez,

Quase perto demais por mais uma hora.


Belo Horizonte - 20 11 2005


quarta-feira, 2 de abril de 2025

GRAFOMANIA

GRAFOMANIA

Por hábito ou distúrbio, tenho escrito

Essas frases que alguns chamam de versos.

Proponho pensamentos controversos,

Tentando fazer soar algo bonito…


Vez ou outra, eu especulo do infinito,

Enquanto crio em vão vãos universos.

Ou caio em mim no afã por ais dispersos,

Em face do que já desacredito.


Eu faço caber letras mal traçadas

Dentro de minhas horas perturbadas,

Ao preencher o vazio de existir.


Mas não cuido se agrado a quem me lê.

Apenas deixo ao vulgo sem porquê

Algo para pensar e até sorrir.


Belo Horizonte - 01 04 2025



DISRUPTO

DISRUPTO


Outra embira pocou. Na travessia…

Foi um-deus-nos-acuda estrada afora.

O tempo e o pensamento, ainda agora,

Não veem senão total desalegria.


Corta o fio da meada quem havia-

De perder o arrazoado, muito embora

O curso do discurso desde outrora

Em face da tropeira alegoria.


E não desconversaram: Rompimento.

O que entendera eu coisa de momento,

Se mostrou a cumeada da montanha.


Outra embira pocou. Na caminhada…

D’ali foram sozinhos pela estrada,

Cada qual com a própria história estranha.


Mateus Leme - 28 03 2025


terça-feira, 1 de abril de 2025

BANANA-OURO S/A

BANANA-OURO S/A


Antes, compram a preço de banana;

Depois, vendem a preço d'ouro fino.

Verdadeira mentira, sô menino,

A ríspida arrogância d'um bacana.


De primeiro, faz crer que não s' engana;

No afinal, faz pensar que foi destino.

Mas, de vera, era tudo um desatino,

O perde-ganha vil de gente insana.


Esperanças à parte, s'especula...

Mas tanto faz a fome quanto a gula:

Uma hora todo mundo quer comer.


"Olha a banana!" - gritam no pregão

Verdade, sô menino, era ilusão:

Não há nada a ganhar, só a perder.


Betim - 20 03 2025 

DILEMA

DILEMA

Entre aquilo que quero e o que preciso,
Encontro a escuridão da encruzilhada.
Por desoras, o nada além do nada
Cogito filosófico e indeciso:

Pondero prós e contras; desrealizo
Planos d'uma existência iluminada.
Farei quanto m'exige a hora passada,
Mesmo tendo-de andar de sobreaviso.

A escolher, dois sentidos lado a lado.
Qualquer que seja o rumo, por fim, dado,
Ainda haverá perda e desalento.

Ou isto ou aquilo? Ainda hesito...
Tanta insatisfação que acredito 
Já não ser eu senão o meu lamento.

Betim - 15 03 2025