segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

ANTIPOÉTICO

ANTIPOÉTICO


Não há nada de bom nem de bonito 

Qu’eu possa hoje expressar como poesia…

Nem nada de verdade ou alegria 

Que possa pretender-se algo infinito.


Parece que em mais nada eu acredito!

Parece não haver mais fantasia!

Se escrevo, é impressão do dia a dia

Já sem qualquer paixão pelo descrito.


De tédio, indiferença e alienação

S’enchera o meu cansado coração

Depois d’algumas horas de vazio.


Se me olhais condenável a actitude,

Sabei vós que mais nada a mim me ilude

Em meio a um mundo mais e mais sombrio.


Betim - 05 01 2021

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

AMBOS OS DOIS

AMBOS OS DOIS


Nós somos, eu e tu, dois desvalidos,

Que se reveem depois de mil azares…

Ambos a suspirar por novos ares

E até nos sofrimentos parecidos.


Sim, uns seres ambíguos, divididos

Entre cumprir deveres ou folgares!…

Deixando vãos por todos os lugares,

Mesmo ainda entre si desconhecidos.


Agora juntos, pela escuridão

Caminhamos confusos, mão a mão,

Temendo o fundo abismo logo ao lado.


Atravessemos outra madrugada!

Visto que não o fim, sim a jornada

Clareie tanto o presente que o passado.


Betim - 10 01 2021


segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

DESIMPORTANTE

DESIMPORTANTE

E eu, que não sei nada; não sou nada,
Vivi o amor estranho dos erráticos…
Não me ceguei a lábios quase apáticos,
Em meio a uma afeição desencontrada.

Fui quem atravessou a madrugada
E vaguei sob as sombras dos lunáticos:
Aceito outra miséria em termos práticos
D’aquela solidão enamorada!

Embora eu queira muito, tive pouco 
De quanto tive em paga dos carinhos,
Que tanto esperdicei por meus caminhos.

E mesmo à vista grossa; ouvido mouco,
Me fazes encarar a todo instante
Minha presença a ti desimportante…

Betim — 28 12 2020

sexta-feira, 7 de janeiro de 2022

QUEM D'ERRANÇA EM ERRANÇA

QUEM D’ERRANÇA EM ERRANÇA


Quem d’errança em errança

Põe a perder seu amor,

Há-de andar em desfavor

D’aquela cuja lembrança

Lhe animara em meio a dor…


Quem vai d’amor em amor

Há-de perder-se na andança…

Vivendo tão-só de esp’rança

Feito o ávido beija-flor

Que abandona quanto alcança.


D’errança em errança avança

Sem que chegue aonde for…

Pousando de flor em flor,

Se faz de eterna criança

Pelo afã de mais sabor.


D’errança em errança o ardor

O leva em ligeira dança

Em meio à desconfiança

Dos que houveram dissabor

Face à sua insegurança.


Quem, infiel da balança,

Muda de tudo o valor,

Tampouco alcança louvor.

Aliás, já vai com tardança,

Deixando só desamor.


Betim - 24 12 2020


segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

OURO-E-FIO

OURO-E-FIO


Nada falte nem sobre p’la balança,

Tampouco te fies mais que o necessário.

No fio do bigode, um numerário

Acorde em hombridade e temperança.


Lembra: – “Houveram-te um nome por herança!...”

E nada queiras ter co’o perdulário,

Senão a decepção... Pelo contrário,

Evita até as ruas de sua errança!!! 


Falseio da palavra igual de peso

Faz parecer valer o que não vale

Tal como o esperto em face do indefeso.


Do mesmo modo um homem equivale

Àquilo que a consciência faz feliz,

Ao ser tanto o que faz quanto o que diz.


Betim - 20 12 2021


sábado, 1 de janeiro de 2022

AVASSALADORA

AVASSALADORA 


Como fosse um aríete, ela vem

Rompendo-me a defesa a cavaleiro.

Avança ao revelim quase fronteiro

Às guardas que a portada mal sustêm.


Vem através das chamas, como quem

Tem o corpo fechado ao hábil arqueiro

E se lança à vanguarda, flor-de-cheiro, 

A ocupar o lugar do querer bem.


Mal chega e se assenhora do fortim:

Irrompe à praça d’armas e à portela;

Comanda do torreão a cidadela.


Avassaladora e ávida de mim,

Onde nunca ninguém antes me houvera,

Ela vem e me traz a primavera!


Belo Horizonte - 22 09 2021