COMPLEXO DE HELENA - SEXOPATIAS MAGINÁRIAS
Como todos os complexos psicopáticos, o complexo de Helena se refere mais propriamente sobre a associação de doenças mentais e um conjunto de sintomas típicos decorrentes de situações existenciais específicas a ponto de causar estranhamento aos indivíduos neurotípicos. De difícil diagnóstico pela séria carga de controle moral que acompanha as pacientes por parte do restante da sociedade, o helenismo se define enquanto consequência do excesso de atenção-admiração-julgamento-expectativas que as mulheres muito bonitas recebem das pessoas o tempo todo ao longo de suas vidas.
A história de Helena de Tróia, a mulher que suscitou um conflito internacional por deixar o esposo-rei para viver como o amante-príncipe, é preciosa para descrever as características da complexada helenista, a saber, uma mulher que tem na beleza uma arma de destruição em massa. Empoderada por uma beleza fascinante, a mulher percebe haver um papel social elevado para si se permitir usar da sedução para conquistar homens em posição de comando ou mesmo alavancar sua fama em meio às mídias pop-artísticas e às redes sociais. Cientes do impacto que provocam sobre as pessoas, a helenista assume uma posição ambígua de gozo pelo excesso de atenção bem como de sofrimento pelo excesso de julgamento. São desejadas tanto quando invejadas, o que lhes afasta progressivamente do contacto comum e da exposição continuada para círculos mas restritos de convivência. De certa maneira, é como se a beleza feminina fosse intimidadora o bastante para influenciar toda sorte de encontro humano que atravessa a vida das complexadas. Pode-se destacar como sintomas típicos do complexo de Helena:
- personalidade narcisista e egocentrismo;
- cinismo estrutural comportamental;
- excessiva frieza afectiva e realismo emocional;
- baixa libido ou mesmo assexualidade funcional;
Pode se firmar que todos os tabus religiosos e morais recorrentes nas mais diversas culturas ao longo da História no sentido de normatizar sobre o pudor feminino tinham, por via de regra, inibir a possibilidade de dar destaque às mulheres do povo através da beleza. Vestimentas como véus, burcas, capuzes, perucas etc... foram infligidos às mulheres ao longo dos séculos para indistinguir as mulheres. N'esses contextos, apenas mulheres da realeza ou da nobreza poderiam se apresentar culturalmente com mais liberalidade, ainda que submetidas aos mesmos tabus. A estas mulheres de alta sociedade, além da beleza física somava-se o esmero da educação e o talento artístico de modo a criar um corolário de virtudes que a destacassem. A helenista se percebe no mundo como uma mulher merecedora de atenção generalizada e a potencializa com excessivo apuro nos cuidados com a aparência e o vestuário.
Além da conversação e da polidez, cultiva a helenista o senso de observação e se acostuma a fazer para si análises de personalidade das pessoas de seus círculos sociais. Têm propensão ao autoritarismo e não raro são conservadoras no campo das ideias, embora dificilmente expressem opiniões controversas ou se apresentem a debater o que seja sem controlar o fio da conversa. Notadamente espirituosas, desqualificam o interlocutor rebelde com apreciações risíveis acerca d'algum ponto fraco do oponente antes que a conversa se revele desagradável, sempre dominando a cena. Esse ar de superioridade latente construído a partir d'uma beleza intimidadora faz da helenista uma pessoa com pouco senso de realidade e absolutamente incapaz de colocar no lugar d'aqueles a quem considera menos afortunados. Adquire com o tempo a estranha convicção de que todos estão a seu serviço, tal a quantidade de mimos, regalos, presentes e deferências que os outros, como se encantados, lhe dedicam. Helenistas não têm amigos, têm séquitos; não têm amores, têm oportunidades. São continuamente denunciadas como alpinistas sociais, mas a verdade é que o senso comum exige beleza extraordinária para famoso "le phisique du rôle" dos membros dos círculos elitistas.
Paradoxalmente, são tão atraentes quanto assexualizadas... Na verdade, enxergam no sexo apenas mais um instrumento de sedução do que um prazer propriamente dito. Não que se neguem à prática sexual, antes à sexualidade. No fundo a helenista considera o seduzido uma pessoa moralmente fraca, ou melhor, um títere manipulável. Logo, a encantadora jamais se encanta. Se a beleza é a promessa do prazer — como advoga Sthenhall — a beleza feminina seria a promessa d'um encontro humano excepcional, tanto afectivamente quanto sexualmente. Logo, é d'essa ideia verificada no senso comum que se constrói o palácio de vaidades da helenista. A contínua promessa do prazer mantêm seus admiradores enredados a suas ambições e retroalimentam sua autoestima a ponto de considerarem dano colateral o rastro de destruição que deixam ao longo de suas existências. Nomes, pessoas, dignidades e até nações, como no caso de Helena de Tróia, sacrificados na fogueira de seu altar.
Betim - 15 05 2022
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