TRÊS DE OUTUBRO
Impacienta-me não saber o que fazer
n'esse momento grave de minha vida, quando
meus passos não me conduzem e as portas não se abrem.
Tenho ânsias de infinito, mas vomito vinho doce...
Pretenso tantas coisas, desconfio não ser mais nada
e aguardo o Juízo como se já morto e enterrado. Não há
umbrais d'onde minhas carnes possam retornar incorruptas...
Não, tudo o que há é a estranheza d'este momento
que se arrasta faz semanas sem me propor veredas.
Pela primeira vez na vida tenho medo.
Temo a hipertensão e a guerra global em igual medida, claudico
há dias pelas ruas de minha cidade: Há dor.
Temo o dinheiro curto e as pequenas expectativas, pior:
Temo ter me tornado irrelevante.
Esquecido no corredor d'alguma corporação, eu verso
ciente de que deveria trabalhar, mas não há trabalho senão
enxugar o gelo do icebergue à deriva...
Não sou sequer um perdedor, pois, não entrei em campo.
Não fui bom o bastante para envergar o uniforme e ser carne de canhão.
Há conflitos nas ruas; nos becos... Há sombras
estendendo-se por sobre toda a metrópole. Há sinais
de fumaça e poeira informando do fim próximo. Há tardes
de sol abrasador com a secura de saaras enquanto passo a caminho. Há ódios
reverberando em milhões de olhos vidrados em telas azuis que hipnotizam. Há distâncias
capazes de desumanizar os outros e a mim mesmo para os outros... Basta!
É preciso continuar andando.
Todavia, aonde vou?
Estou velho demais para m'empolgar com promessas de sucesso.
Já ouvi muitas; já persegui várias...
Estou cansado. Não, estou entediado.
E jamais se deve subestimar o poder criador-destruidor do tédio.
Betim - 2019
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