MALDITOS! n°3
Peno eu -- três ou quatro gerações --
Amaldiçoando todos no pecado
Que nos predestinou junto aos vilões!
Deveras, parvo e obscuro antepassado,
Pus minha iniquidade sobre os meus
Uma vez para sempre amaldiçoado...
Antes já natimorto entre os plebeus
Que agora constranger-nos desde o gen
Viver em guerra infinda contra Deus!
Como ignorasse d'onde a bênção vem,
Sem temer me cobrir de pestilências...
Maldito, escolho o mal e evito o bem.
Ao desdenhar de Deus suas violências
Sobre mim e meus tristes descendentes
É que busquei nos vícios experiências.
Uma vez condenado, ranjo os dentes
Urrando contra as hostes celestiais
E a multidão submissa de seus crentes.
Sim, vêm me perseguir feito animais
Pois co'a marca de Caim, homem de cor,
Com os filhos de Cam eu ergui baais!
Excluído do povo do Senhor,
Sigo a errar d'outro lado do Jordão
Como a face d'opróbrio e do terror:
Quem de longe me vê na imensidão
M'escojura qual visse o deus Moloque
Com chifres a queimar na escuridão!
E vem me apedrejar sem que o provoque
Para que assim me afaste mais ainda,
Pintando-me um demônio sem retoque.
Certo que minha culpa jamais finda,
Aos olhos d'estes homens bons e justos
Convém lhes evitar a terra linda.
Vagando nos desertos entre arbustos
A medo de topar quem quer que seja
E alerta de perigos e outros sustos...
Resta rogar a Deus, por onde esteja,
Que me mate antes qu'eu, de todo aflito,
Devolva ao mundo o mal que me deseja!
Só sei não ver justiça no infinito
Expurgo de más culpas cuja pena
Me faz eternamente ser maldito.
Betim - 03 11 2018
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