EXTREMA-UNÇÃO
À morte, faço as contas d'esta vida...
Listo arrependimentos e remorsos,
Que, a despeito de todos os esforços,
Revisitam minh'alma combalida.
Ao pé do leito o padre me convida
A mais rogar dos anjos os reforços,
Embora eu, a esconder dedos retorsos,
Desdenhe a conversão controvertida.
Enquanto a vida passa por meus olhos,
Recebo sobre a testa os santos óleos
À espera que uma doce morte venha.
Ela, porém, se afasta do meu lado
Pouco depois d'eu ser desenganado
Para que falsas promessas eu mantenha!
Betim - 07 12 1998
Espaço para exibição e armazenamento de poemas à medida que os vou escrevendo. Espero contar com o comentário de leitores atentos e gente com sensibilidade poética por acreditar que o poema acabado não precisa ser o fim de uma experiência, sim o início de um diálogo.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2018
O AGNÓSTICO
O AGNÓSTICO
Não me foi concedido conhecer
Entidades ou espíritos d'Além...
Prodígios nem milagres vi também,
Senão os que a Natura faz saber.
Se Deus eu sequer tento compreender,
É que seguir rebanhos não convém.
Em minha mente o Eterno m'entretém
Tanto quanto o Infinito nego haver...
Apenas essa carne onde eu habito
É tudo em que deveras acredito
Com suas sensações e realidades.
O mais são ilusões que em vão contemplo
Nas sós arquiteturas d'algum templo
Onde os homens põem deuses e inverdades.
Betim - 18 12 2018
terça-feira, 18 de dezembro de 2018
POST-MORTEM
POST-MORTEM
”Oh vida, me é vindo o teu fim…
Oh sim, o meu fim seja vindo!”
Como eu despedindo de mim;
Como eu de ti despedindo…
Deixo do mundo quanto é lindo,
Porquanto vindo como eu vim
“Oh sim, o meu fim seja vindo!
Oh vida, me é vindo o teu fim…”
Como eu despedindo, por fim:
Já me basta a mim que existindo
Fosse a vida partindo assim...
“Oh sim, o meu fim seja vindo!
Oh vida, me é vindo o teu fim.”
Betim - 19 11 1991
”Oh vida, me é vindo o teu fim…
Oh sim, o meu fim seja vindo!”
Como eu despedindo de mim;
Como eu de ti despedindo…
Deixo do mundo quanto é lindo,
Porquanto vindo como eu vim
“Oh sim, o meu fim seja vindo!
Oh vida, me é vindo o teu fim…”
Como eu despedindo, por fim:
Já me basta a mim que existindo
Fosse a vida partindo assim...
“Oh sim, o meu fim seja vindo!
Oh vida, me é vindo o teu fim.”
Betim - 19 11 1991
SEXO DOS ANJOS
SEXO DOS ANJOS
Cu não tem sexo: Macho e fêmea têm!
Qualquer um pode dar, se lhe convém,
Àquele que bem quer.
Cu é uma paragem mais sensível
Onde abaixo de muito baixo nível
Costumam a ofender…
Qualquer um pode dar, se lhe convém,
Àquele que bem quer.
Cu é uma paragem mais sensível
Onde abaixo de muito baixo nível
Costumam a ofender…
Se tu, todavia, te permites,
Verás qual explodissem dinamites
Ao tomares no cu.
Em recíproco gozo, a troca-troca,
Quem dá ainda mais recebe em troca…
Assim eu como tu.
Verás qual explodissem dinamites
Ao tomares no cu.
Em recíproco gozo, a troca-troca,
Quem dá ainda mais recebe em troca…
Assim eu como tu.
Tomar no cu supõem ser algo sujo
Ou que possa mudar o dito cujo
De macho n’uma fêmea.
Que tolice!… Se todo mundo é gente
Importa muito mais o que se sente
Na busca d’alma gêmea.
De macho n’uma fêmea.
Que tolice!… Se todo mundo é gente
Importa muito mais o que se sente
Na busca d’alma gêmea.
Há-que se conhecer antes de tudo
Para se permitir quando desnudo
Essa carícia ousada.
E, indiferente se homem ou mulher,
Descobrir-se a alegria do prazer
Enfim compartilhada.
Para se permitir quando desnudo
Essa carícia ousada.
E, indiferente se homem ou mulher,
Descobrir-se a alegria do prazer
Enfim compartilhada.
Sim, porque nos papéis tradicionais
De papai e mamãe tão sempre iguais
Nem um nem outro goza.
Ao contrário, inventando-se desculpas
Tão-só fazem lidar co’as suas culpas
Em vida duvidosa…
De papai e mamãe tão sempre iguais
Nem um nem outro goza.
Ao contrário, inventando-se desculpas
Tão-só fazem lidar co’as suas culpas
Em vida duvidosa…
Ou senão, a extinguir toda a libido,
Têm o desejo já como um tempo ido;
Deixado para trás.
Restando-lhes tão-só consolação
De se buscar prazer em solidão,
Levando carga atrás.
Têm o desejo já como um tempo ido;
Deixado para trás.
Restando-lhes tão-só consolação
De se buscar prazer em solidão,
Levando carga atrás.
Mas não! Não seja o cu desperdiçado
Porquanto limpo e bem lubrificado,
Piscando de ansiedade!
Receba, após mil beijos de minete,
O membro intumescido que se mete
Na funda cavidade.
Porquanto limpo e bem lubrificado,
Piscando de ansiedade!
Receba, após mil beijos de minete,
O membro intumescido que se mete
Na funda cavidade.
Indistinto se erótico ou se vênero.
Não seja mais o amor questão de gênero,
Sim algo natural.
Toma antes para ti como pessoa
Aquele que gozando se atordoa
No teu cu afinal.
Não seja mais o amor questão de gênero,
Sim algo natural.
Toma antes para ti como pessoa
Aquele que gozando se atordoa
No teu cu afinal.
Belo Horizonte — 18 12 2018
APOLOGÉTICA
APOLOGÉTICA
Concedo aos heresiarcas: Têm razão.
Aliás todos, acerca de Deus, têm.
À imagem-semelhante mais convém
A que calhar melhor com a ocasião.
Seja Deus bom pastor no coração;
Ou rei talvez na mente: O Sumo Bem.
Será médico, juiz, banco, armazém...
Recebendo oração e adoração!
Todos têm razão, pois, todos errados:
Islâmicos, cristãos, pagãos, judeus...
Nas vãs verdades que ensinam sobre Deus.
No fim, bem mais importa aos consolados,
-- Sobretudo aos "irmãos" da Cristandade --
A ideia de Deus que a Sua realidade...
Belo Horizonte - 19 11 1998
Concedo aos heresiarcas: Têm razão.
Aliás todos, acerca de Deus, têm.
À imagem-semelhante mais convém
A que calhar melhor com a ocasião.
Seja Deus bom pastor no coração;
Ou rei talvez na mente: O Sumo Bem.
Será médico, juiz, banco, armazém...
Recebendo oração e adoração!
Todos têm razão, pois, todos errados:
Islâmicos, cristãos, pagãos, judeus...
Nas vãs verdades que ensinam sobre Deus.
No fim, bem mais importa aos consolados,
-- Sobretudo aos "irmãos" da Cristandade --
A ideia de Deus que a Sua realidade...
Belo Horizonte - 19 11 1998
ESPIRITUAL
ESPIRITUAL
Ainda lanço luzes sobre o abismo
A perscrutar-me às trevas más moções.
Mas já não busco sombras ou visões,
Não tendo nada além de cepticismo.
Não me investigo o ser por egoísmo,
Andando imerso em minhas solidões.
Antes me ocupo só com reflexões
Sobre o espírito, não o espiritismo...
Eu deixo para os crédulos as crenças
Mais as superstições e as oferendas
Que mudassem dos deuses as sentenças.
Permanecem em mim tal como lendas,
Que já não levo a sério por pretensas;
Ou não lembro sequer por estupendas.
Belo Horizonte - 14 11 1998
Ainda lanço luzes sobre o abismo
A perscrutar-me às trevas más moções.
Mas já não busco sombras ou visões,
Não tendo nada além de cepticismo.
Não me investigo o ser por egoísmo,
Andando imerso em minhas solidões.
Antes me ocupo só com reflexões
Sobre o espírito, não o espiritismo...
Eu deixo para os crédulos as crenças
Mais as superstições e as oferendas
Que mudassem dos deuses as sentenças.
Permanecem em mim tal como lendas,
Que já não levo a sério por pretensas;
Ou não lembro sequer por estupendas.
Belo Horizonte - 14 11 1998
SANTÍSSIMO
SANTÍSSIMO
Para a roda do tempo de correr...
Se todo imerso pelo Santo Esp'rito,
Até o vão do espaço onde estou sito
Em derredor de mim deixa d'haver.
Deveras, haverá tempo a conter
A Eternidade? Espaço há o Infinito?
Se no Livro da Vida está escrito:
-- "Sou Aquele que Sou"-- glória e poder!
Mas, se a consciência é esse quase Nada
Onde meu Ser existe e onde Deus mora,
Transcende o espaço-tempo, ilimitada,
E evade de mim, sem lugar nem hora.
Alcançará, porém, n'essa jornada,
Àquele que, em silêncio só, adora.
Betim 08 07-1998
domingo, 16 de dezembro de 2018
DE CIVITATE DEI
DE CIVITATE DEI
De abstrato-armado s’ergue a Cidade de Deus;
Nas nuvens, logo acima às cidades terrenas.
É bem-aventurado o que por amor apenas
Acolhe indiferente os crentes e os ateus.
No seio dos cristãos, em Sião dos judeus
E com boa vontade após horas amenas...
Ou mesmo ao coração nas entregas mais plenas,
Lá estará Jesus reunido com os Seus.
É d‘onde a verdadeira Igreja longe vai
Buscar o pecador em espírito imerso
Às moradas d’além que tem o Nosso Pai.
Seu rebanho reúne às nações quem disperso:
Nova Jerusalém, cujo traçado sai
Ao plano do Arquiteto o fim d'outro Universo.
Betim – 12 09 1998
De abstrato-armado s’ergue a Cidade de Deus;
Nas nuvens, logo acima às cidades terrenas.
É bem-aventurado o que por amor apenas
Acolhe indiferente os crentes e os ateus.
No seio dos cristãos, em Sião dos judeus
E com boa vontade após horas amenas...
Ou mesmo ao coração nas entregas mais plenas,
Lá estará Jesus reunido com os Seus.
É d‘onde a verdadeira Igreja longe vai
Buscar o pecador em espírito imerso
Às moradas d’além que tem o Nosso Pai.
Seu rebanho reúne às nações quem disperso:
Nova Jerusalém, cujo traçado sai
Ao plano do Arquiteto o fim d'outro Universo.
Betim – 12 09 1998
sábado, 15 de dezembro de 2018
SAGRAÇÃO
SAGRAÇÃO
Ao pórtico minh’alma logo cambaleia,
Embora ainda o corpo, contido, se iniba.
-- O sonho do profeta é o poema do escriba;
A Luz de sua imagem aos versos permeia:
Armas depostas, as mãos livres de quem semeia
Fazem da espada arado por vertente arriba.
Nos pratos da balança a Justiça se iliba
Com sementes de Paz lançadas à mancheia!
Maravilhosa visão que nos olhos contemplo!
Ideal supremo ao qual o coração palpita!
Pois onde honra e humildade se fazem exemplo...
Pela Ordem de Christo, eis a Verdade infinita!
Sobre a pedra angular eu me edifico templo
Em cujo altar, em paz, Seu espírito habita.
Belo Horizonte - 15 08 1998
Ao pórtico minh’alma logo cambaleia,
Embora ainda o corpo, contido, se iniba.
-- O sonho do profeta é o poema do escriba;
A Luz de sua imagem aos versos permeia:
Armas depostas, as mãos livres de quem semeia
Fazem da espada arado por vertente arriba.
Nos pratos da balança a Justiça se iliba
Com sementes de Paz lançadas à mancheia!
Maravilhosa visão que nos olhos contemplo!
Ideal supremo ao qual o coração palpita!
Pois onde honra e humildade se fazem exemplo...
Pela Ordem de Christo, eis a Verdade infinita!
Sobre a pedra angular eu me edifico templo
Em cujo altar, em paz, Seu espírito habita.
Belo Horizonte - 15 08 1998
REZAS
REZAS
Debulhava sementes de braquiárias
Qual contas d'um rosário doloroso,
Que desfiava caminhando pesaroso
Pelo pasto a cuidar das alimárias.
Dos mistérios as rezas fiz diárias,
Quando à desilusão me vi esposo
Sem memória nenhuma d'outro gozo,
Senão cumprir promessas necessárias...
Semeava pelos ventos meus temores
Lançados como os últimos haveres,
Crente d'haver dos males os menores.
Mas forçado p'lo jugo dos deveres,
Meditei de Maria as cinco dores
Entre o querer de Deus e os meus quereres.
Sobrália - 20 09 1998
Debulhava sementes de braquiárias
Qual contas d'um rosário doloroso,
Que desfiava caminhando pesaroso
Pelo pasto a cuidar das alimárias.
Dos mistérios as rezas fiz diárias,
Quando à desilusão me vi esposo
Sem memória nenhuma d'outro gozo,
Senão cumprir promessas necessárias...
Semeava pelos ventos meus temores
Lançados como os últimos haveres,
Crente d'haver dos males os menores.
Mas forçado p'lo jugo dos deveres,
Meditei de Maria as cinco dores
Entre o querer de Deus e os meus quereres.
Sobrália - 20 09 1998
sexta-feira, 14 de dezembro de 2018
MAL-VINDO
MAL-VINDO
Sê mal-vindo tu que andas pelas sombras;
Tu que agora atravessas este umbral,
Cujos passos se orientam para o mal
E com olhos de morte cá me assombras!...
Oh potência das trevas infernal!
És ruína que em ti mesmo t'escombras...
Penoso caminhando nas alfombras,
Justo aqui tua estrada tem final?
--"Eu t'esconjuro! Espírito maligno!
Retorna tu e aqueles de teu signo
Tu és mal-vindo! Três vezes mal-vindo!!!
Trazes tão-só desgraça e mais discórdia
Aos festins que transformas em mixórdia,
Se inspiras, na balbúrdia discutindo,
Um conviva com outro desavindo!...
Sim, vai-te embora! Tem misericórdia
Dos que aqui se abrigam em concórdia
Antes que o nosso tempo seja findo.
-- "Caminha pela noite quem na noite
Mais espezinha as almas com açoite."
Mal-vindo pois maldito! Em maldições
És recebido aonde quer que vás...
Tu, que das horas boas fazes más,
Envenenando em vão os corações.
Deixa-nos com as nossas opiniões
Sem que nos manipules por detrás.
Tu, que nos trazes guerra, vai em paz
E busca companhia entre os vilões...
-- "Dá meia volta! Torna já d'aqui,
Esta casa não é lar para ti!..."
Betim - 14 12 2018
Sê mal-vindo tu que andas pelas sombras;
Tu que agora atravessas este umbral,
Cujos passos se orientam para o mal
E com olhos de morte cá me assombras!...
Oh potência das trevas infernal!
És ruína que em ti mesmo t'escombras...
Penoso caminhando nas alfombras,
Justo aqui tua estrada tem final?
--"Eu t'esconjuro! Espírito maligno!
Retorna tu e aqueles de teu signo
Tu és mal-vindo! Três vezes mal-vindo!!!
Trazes tão-só desgraça e mais discórdia
Aos festins que transformas em mixórdia,
Se inspiras, na balbúrdia discutindo,
Um conviva com outro desavindo!...
Sim, vai-te embora! Tem misericórdia
Dos que aqui se abrigam em concórdia
Antes que o nosso tempo seja findo.
-- "Caminha pela noite quem na noite
Mais espezinha as almas com açoite."
Mal-vindo pois maldito! Em maldições
És recebido aonde quer que vás...
Tu, que das horas boas fazes más,
Envenenando em vão os corações.
Deixa-nos com as nossas opiniões
Sem que nos manipules por detrás.
Tu, que nos trazes guerra, vai em paz
E busca companhia entre os vilões...
-- "Dá meia volta! Torna já d'aqui,
Esta casa não é lar para ti!..."
Betim - 14 12 2018
quinta-feira, 13 de dezembro de 2018
GENEALOGIA DO POEMA
GENEALOGIA DO POEMA
D'onde vem o poema? Quem é seu pai?
Em que ventre é pacientemente gerado? Quem é sua mãe?
A quem pertence? Criatura d'um deus criado... Sim: o poeta!
Pois bem, pode o poeta,
inspirado por musas ou assombrado por fantasmas,
deixar sobre o papel suas impressões antes
que os leitores se apropriem do texto
e o reescrevam a cada leitura?
Semelhante a Deus, o poeta é um pai ausente:
Abandona o poema e vai cuidar de si. Ou do Universo...
Resta ao poema passar pela existência absurda dos poemas:
Existir sempre que os olhos pousam sobre as letras
Ou que os ouvidos lhes percebam as sílabas.
Seja em caracteres; seja em sons, o poema chega ao leitor.
É sua grande missão, afinal, para isso fora escrito,
ainda que o poeta o negue, autossuficiente,
argumentando tê-lo escrito como necessidade d'expressão.
Se assim fosse, não sairia da gaveta, não
viria a lume confuso e frágil; não
encheria páginas e páginas com sensibilidade, não
atravessaria os séculos e os oceanos, não
habitaria, ainda que por instantes, no coração e mente do leitor.
O poeta se defende porque sabe o poema com seus traços: É seu filho.
Deriva de sua mente e de suas sua visão de mundo, logo,
as fragilidades d'ele são fragilidades suas. Exposto,
o poeta se vê no poema.
Sangue do seu sangue, como um filho,
o poema é o poeta, subsiste-lhe.
E é essa consanguinidade que o exaspera.
Betim - 13 12 2018
AVOENGO
AVOENGO
Vem desde o meu avô essas olheiras;
Essa insônia sem fim, esse cansaço
Logo ao aboio dos bois: Currais, porteiras...
Cumpri a obrigação, um mau pedaço:
Casei e descasei; criei meninas
E por prédios deixei meu fino traço.
Também vômito e versos nas esquinas
Além d'um fatalismo que não sei
Se fez o não mais baças às retinas...
Sem embargo, não fui filho de rei.
Tampouco de nobre ou de burguês,
Antes filho do mundo me tornei.
Venho das madrugadas, ou talvez,
Das madrugadas venham tais alardes
Entremeados de bílis e embriaguez:
-- "Envelhecer é a arte dos covardes!
Dos que, como eu, bateram retirada
Sem grandes alaridos nem retardes..."
"Eu deixo para trás montes de nada,
Desço rios de lágrimas, subo abismos
E contemplo os estratos da alvorada."
"Tolerei do egoísta os egoísmos
E ainda dos histriões as histrionices
Até render-me ao puro cepticismo..."
"Sem ascendente em Gêmini ou Pisces,
Jamais mostrei aos outros quem eu era,
Senão para amargar com pedantices."
"Tornei-me pouco a pouco uma quimera
De mim mesmo sem lastro pela vida,
Nos ecos que meu canto reverbera."
"Porque fazer a vida mais comprida
Tão-só adia a triste e má verdade,
Que a gente vive sempre de partida."
"Se após de meu avô caminho a herdade
A ver as suas obras e conquistas,
Tão-só ruínas trago à claridade."
"Bem breve se marejam minhas vistas
A lembrá-lo chamar com voz robusta
Às reses ressurgindo-lhe imprevistas."
"Fico parado a vê-lo, não sem susto,
Como se na porteira ora estivesse
Ou reclinado à sombra d'um arbusto."
"A casa em que viveu; os filhos, a messe...
Tudo aquilo que há muito se perdera
Como nunca existido ali houvesse."
"Se ele, que tanto teve e eu não tivera,
Pôde deixar de ser sem mais nem quê,
Quanto mais eu? De quem nada s'espera."
"Não pretendo do Fado mais mercê
Que desaparecer, vago e discreto,
Sem que ninguém sequer finja o porquê."
"E os lamentos que canto quando poeto
Deixo afinal dispersos como folhas
Que esvoaçam por um pé de vento inquieto."
"Eu, maestria, tão-só co'o saca-rolhas
Para vinho entornar... Pois na poesia,
Nem erros nem acertos, só escolhas."
"Fosse eu sensato, nada escreveria
Muito menos sonetos ou rondéis
Que pouca gente a ler se me atrevia."
"Deixava para os vates seus lauréis
E com eles as palmas recebidas
Dos leitores mais gratos e mais fiéis."
"Restem-me essas vidas esquecidas
Cuja herança carrego inopinado
Em memórias que nunca serão lidas."
Encerro esse monólogo arrastado,
Mas sobretudo estúpido e inconcluso,
Deixando ora o leitor desobrigado.
Pois mais ideias caindo em parafuso
Apenas os conduzem à loucura
D'um poeta já excêntrico e confuso.
Quem mais sabedoria se procura
Não há-de pelas linhas mal traçadas
De s'encontrar senão mais amargura.
Tampouco queira achar em mim carradas
Já d'alguma poesia tão sapiente
Que faça às almas mais edificadas.
Ler-me-ão desavisados tão-somente
Ou os desinteressados em más vidas
Atrás de seus azares simplesmente.
E, olhando-me o retrato, as coisas idas
Deem um sentido qu'eu jamais tivera
N'essas olheiras sempre escurecidas..."
Betim - 13 12 2018
quarta-feira, 12 de dezembro de 2018
MILÊNIO - ou o fim do mundo que não veio
MILÊNIO - ou o fim do mundo que não veio
"Ao menos pude ver o fim do mundo
Ou senão o Milênio que o promete..."
-- Na esperança que então se nos repete
D'outro ponto final vasto e profundo.
O alvorecer do fim me foi fecundo,
Coberto de ressaca e de confete.
Depois de regressar do rio Lete,
Em versos e champanhe já desbundo:
-- "Evoé! Vinde findar-nos, Antichristo!
Cumpri do Apocalipse os sete selos,
Realizando os sinais como previsto...
Mas na branca manhã de meus desvelos,
Não vi quaisquer prodígios senão isto:
"Os mesmíssimos males e atropelos!..."
Betim - 12 12 2018
"Ao menos pude ver o fim do mundo
Ou senão o Milênio que o promete..."
-- Na esperança que então se nos repete
D'outro ponto final vasto e profundo.
O alvorecer do fim me foi fecundo,
Coberto de ressaca e de confete.
Depois de regressar do rio Lete,
Em versos e champanhe já desbundo:
-- "Evoé! Vinde findar-nos, Antichristo!
Cumpri do Apocalipse os sete selos,
Realizando os sinais como previsto...
Mas na branca manhã de meus desvelos,
Não vi quaisquer prodígios senão isto:
"Os mesmíssimos males e atropelos!..."
Betim - 12 12 2018
A ESPADA DE DÂMOCLES
A ESPADA DE DÂMOCLES
Busca antes à vaidade que à verdade
Aquele se coloca sobre todos,
Embora com bravatas e denodos
A jactar-se com grande propriedade.
Quem se dá excessiva liberdade,
Tentando aconselhar de muitos modos,
Não percebe por sobre seus engodos
A espada por um fio de maldade...
Como de tudo aquilo fosse dono.
Patético, dos outros zomba e ri.
Até que horrorizado, quase ao sono,
Vê a espada pendente sobre si!
Betim - 12 12 2018
Busca antes à vaidade que à verdade
Aquele se coloca sobre todos,
Embora com bravatas e denodos
A jactar-se com grande propriedade.
Quem se dá excessiva liberdade,
Tentando aconselhar de muitos modos,
Não percebe por sobre seus engodos
A espada por um fio de maldade...
Assemelha-se a Dâmocles no trono:
Refestelado em luxo aqui e aliComo de tudo aquilo fosse dono.
Patético, dos outros zomba e ri.
Até que horrorizado, quase ao sono,
Vê a espada pendente sobre si!
Betim - 12 12 2018
terça-feira, 11 de dezembro de 2018
SR. BOM SENSO
SR. BOM SENSO
Que se difira o sábio do sabido,
Bem como o poeta douto do pretenso...
Ainda que seu saber seja imenso
E o laurel pelas letras merecido.
No trato co'os demais aborrecido,
Mostra-se, todavia, um tanto infenso,
Como fiscal da escrita por bom senso
Entre o condescendente e o descabido.
Sim, o Bom Senso: Filho do Bom Gosto;
Pai do Senso Comum e do bastardo
Clichê... Que não lhe dá senão desgosto!...
Pois esse afrancesado felizardo
Entende do leitor por pressuposto
Um intelecto inculto e meio tardo.
Betim - 11 12 2018
Que se difira o sábio do sabido,
Bem como o poeta douto do pretenso...
Ainda que seu saber seja imenso
E o laurel pelas letras merecido.
No trato co'os demais aborrecido,
Mostra-se, todavia, um tanto infenso,
Como fiscal da escrita por bom senso
Entre o condescendente e o descabido.
Sim, o Bom Senso: Filho do Bom Gosto;
Pai do Senso Comum e do bastardo
Clichê... Que não lhe dá senão desgosto!...
Pois esse afrancesado felizardo
Entende do leitor por pressuposto
Um intelecto inculto e meio tardo.
Betim - 11 12 2018
OSSUÁRIO
OSSUÁRIO
Entre úmeros e fíbulas mexidas
Mais falanges em pó de volta ao pó,
Fêmures sustentando um crânio só
Qual feixes de esculpturas divertidas.
As catacumbas d’ossos revestidas
Herdam do campo santo fieis tão-só.
Onde obscuros artistas sem mais dó
Põem caveiras de tíbias guarnecidas!
Com efeito, se admira à luz de velas
Inumeráveis vértebras, costelas,
Mandíbulas, clavículas e escápulas…
Mas vindo à cripta mais que de ordinário,
Indiferentes, põem n’um relicário
Ossos tanto de santos que de crápulas.
Betim—10 12 2018
Entre úmeros e fíbulas mexidas
Mais falanges em pó de volta ao pó,
Fêmures sustentando um crânio só
Qual feixes de esculpturas divertidas.
As catacumbas d’ossos revestidas
Herdam do campo santo fieis tão-só.
Onde obscuros artistas sem mais dó
Põem caveiras de tíbias guarnecidas!
Com efeito, se admira à luz de velas
Inumeráveis vértebras, costelas,
Mandíbulas, clavículas e escápulas…
Mas vindo à cripta mais que de ordinário,
Indiferentes, põem n’um relicário
Ossos tanto de santos que de crápulas.
Betim—10 12 2018
O CARIOCA
O CARIOCA
Mas contam que Bocage aqui andando
Pela ampla Guanabara, de passagem,
Reteve enternecido a sua viagem,
Loas tecendo ao Rio venerando.
Assim, o gentil Janeiro sonetando,
Calhou a si tão bem quanto a paisagem
Um ardor tropical de bom selvagem,
Que pela terra o foi apaixonando.
Escreve lisonjeiro ao vice-Rei
A fim-de que intervisse contra a lei,
Cá ficando a poetar em desvario.
Baldas quedam as súplicas, porém.
Restando-lhe clamar como convém:
-- "Nem Goa nem Lisboa... Quero o Rio!"
Betim - 09 12 2018
Mas contam que Bocage aqui andando
Pela ampla Guanabara, de passagem,
Reteve enternecido a sua viagem,
Loas tecendo ao Rio venerando.
Assim, o gentil Janeiro sonetando,
Calhou a si tão bem quanto a paisagem
Um ardor tropical de bom selvagem,
Que pela terra o foi apaixonando.
Escreve lisonjeiro ao vice-Rei
A fim-de que intervisse contra a lei,
Cá ficando a poetar em desvario.
Baldas quedam as súplicas, porém.
Restando-lhe clamar como convém:
-- "Nem Goa nem Lisboa... Quero o Rio!"
Betim - 09 12 2018
segunda-feira, 10 de dezembro de 2018
MANÍACO
MANÍACO
Caminha pelas sombras, predador,
Belo e mau como um lívido Satã.
À caça de mulheres cujo amor
Revelará mortal pela manhã…
Com efeito, as mais ávidas em flor
Quedam hipnotizadas n'esse elã
Que envolve todo grão conquistador
Às voltas com orgia assim pagã.
Finge ser dos amantes o melhor.
Porém, tão-logo as deita no divã,
Parece confundir prazer e horror
Pronto a lhes devorar a carne chã.
Sua ânsia de prazer só não é maior
Que o apetite por sangue cujo afã
O leva a conduzir ao seu sabor
Às moças que seduz com lábia vã.
Deveras, a ocasião se faz melhor
A sós na alcova… Pois, moral malsã
Dá razão ao misógino valor
Que ainda faz da vítima a vilã…
Matava indiferente do estupor,
Fosse ela donzela ou cortesã…
Em plena foda, ao gozo, em pleno ardor;
Deixando-a inerte já sem amanhã.
Traz consigo, em memória do terror,
À guisa de troféu ou talismã,
D'elas alguma joia em seu favor,
Quer fosse um camafeu ou cruz cristã.
E some… Sem deixar senão pavor.
Após tomar a morte como irmã,
Um maníaco em série matador
Se mostra a insanidade mais insã.
Betim - 08 12 2018
Caminha pelas sombras, predador,
Belo e mau como um lívido Satã.
À caça de mulheres cujo amor
Revelará mortal pela manhã…
Com efeito, as mais ávidas em flor
Quedam hipnotizadas n'esse elã
Que envolve todo grão conquistador
Às voltas com orgia assim pagã.
Finge ser dos amantes o melhor.
Porém, tão-logo as deita no divã,
Parece confundir prazer e horror
Pronto a lhes devorar a carne chã.
Sua ânsia de prazer só não é maior
Que o apetite por sangue cujo afã
O leva a conduzir ao seu sabor
Às moças que seduz com lábia vã.
Deveras, a ocasião se faz melhor
A sós na alcova… Pois, moral malsã
Dá razão ao misógino valor
Que ainda faz da vítima a vilã…
Matava indiferente do estupor,
Fosse ela donzela ou cortesã…
Em plena foda, ao gozo, em pleno ardor;
Deixando-a inerte já sem amanhã.
Traz consigo, em memória do terror,
À guisa de troféu ou talismã,
D'elas alguma joia em seu favor,
Quer fosse um camafeu ou cruz cristã.
E some… Sem deixar senão pavor.
Após tomar a morte como irmã,
Um maníaco em série matador
Se mostra a insanidade mais insã.
Betim - 08 12 2018
sábado, 8 de dezembro de 2018
A ÚLTIMA TENTAÇÃO
A ÚLTIMA TENTAÇÃO
O fardo que carrego ora m’esmaga
Sob signo do egoísmo que em mim nasce.
Meu pecado está sempre à minha face...
Sei que mero remorso não m’o apaga.
Percebo já meu ombro aberto em chaga
E, talvez, à medida que a Hora passe
Mais pesada a matéria se tornasse
Me perfurando a carne feito adaga!
Eis que ouço a gargalhada vã do Diabo...
Após m’enganar no erro a pouca fé,
Com vis sofismas eu por terra acabo.
Por mea culpa! Mea maxima culpa!! É
Ver-me feito refém ao fim e ao cabo
E minh’alma imortal eterna ré!...
Betim - 04 12 1998
O fardo que carrego ora m’esmaga
Sob signo do egoísmo que em mim nasce.
Meu pecado está sempre à minha face...
Sei que mero remorso não m’o apaga.
Percebo já meu ombro aberto em chaga
E, talvez, à medida que a Hora passe
Mais pesada a matéria se tornasse
Me perfurando a carne feito adaga!
Eis que ouço a gargalhada vã do Diabo...
Após m’enganar no erro a pouca fé,
Com vis sofismas eu por terra acabo.
Por mea culpa! Mea maxima culpa!! É
Ver-me feito refém ao fim e ao cabo
E minh’alma imortal eterna ré!...
Betim - 04 12 1998
sexta-feira, 7 de dezembro de 2018
DEUS EX-MACHINA
DEUS EX-MACHINA
E no final Deus salva, não o herói.
Seus transes de ventura e desventura
Fazem-lhe das histórias escritura
A um público que aflito se condói.
De modo que a existência humana sói
A peripécias vãs beira à loucura.
Pois não se salva o herói -- triste figura! --
E o Deus que tudo fez também destrói...
Vem redentor, igual no Corcovado
-- Sobre as nuvens em seu imenso abraço --
Salvar enfim o herói de seu fracasso.
Pois Deus, em desenredo inesperado,
Do palco-Mundo é máquina ilusória,
Que traz ao herói sem mérito a vitória!
Betim - 26 05 1998
E no final Deus salva, não o herói.
Seus transes de ventura e desventura
Fazem-lhe das histórias escritura
A um público que aflito se condói.
De modo que a existência humana sói
A peripécias vãs beira à loucura.
Pois não se salva o herói -- triste figura! --
E o Deus que tudo fez também destrói...
Vem redentor, igual no Corcovado
-- Sobre as nuvens em seu imenso abraço --
Salvar enfim o herói de seu fracasso.
Pois Deus, em desenredo inesperado,
Do palco-Mundo é máquina ilusória,
Que traz ao herói sem mérito a vitória!
Betim - 26 05 1998
quinta-feira, 6 de dezembro de 2018
A EMENDA
A EMENDA
Escrevendo um soneto atarantado,
Enveredei por rimas que, tonantes,
Aqui e ali variam as consoantes
Deixando o verso frouxo e descuidado.
No afã de ver o poema publicado,
Envio-no com pressa aos contratantes,
Que me advertem das rimas um pouco antes
De levarem ao prelo um verso errado.
Folha à mão, considero-lhe os poréns,
Co'os olhos sobretudo nos vinténs
Que me darão a paga por completo.
Encabulado em tomar a decisão,
Atraso a primeiríssima edição
E a emenda me sai pior do que o soneto...
Betim - 06 12 2018
Escrevendo um soneto atarantado,
Enveredei por rimas que, tonantes,
Aqui e ali variam as consoantes
Deixando o verso frouxo e descuidado.
No afã de ver o poema publicado,
Envio-no com pressa aos contratantes,
Que me advertem das rimas um pouco antes
De levarem ao prelo um verso errado.
Folha à mão, considero-lhe os poréns,
Co'os olhos sobretudo nos vinténs
Que me darão a paga por completo.
Encabulado em tomar a decisão,
Atraso a primeiríssima edição
E a emenda me sai pior do que o soneto...
Betim - 06 12 2018
PERIPATÉTICO
PERIPATÉTICO
-- "Eis aqui uma árvore de louro.
Acolá, uma fonte d'água pura..." --
Assim o grande mestre se afigura
Lendo ao livro da vida seu tesouro.
E continua: --"Valem mais do que ouro
As lições observadas na Natura!" --
Lógico, o Estagirita outra leitura
Deixava para um século vindouro".
Andando pelos campos macedônios
Se ri tanto de deuses e demônios
Que usam para explicar o inexplicável...
E no afã de instigar os seus discípulos,
Mostrava o quanto os dogmas são ridículos,
Visto saberes d'um mundo imutável.
Betim - 05 12 2018
-- "Eis aqui uma árvore de louro.
Acolá, uma fonte d'água pura..." --
Assim o grande mestre se afigura
Lendo ao livro da vida seu tesouro.
E continua: --"Valem mais do que ouro
As lições observadas na Natura!" --
Lógico, o Estagirita outra leitura
Deixava para um século vindouro".
Andando pelos campos macedônios
Se ri tanto de deuses e demônios
Que usam para explicar o inexplicável...
E no afã de instigar os seus discípulos,
Mostrava o quanto os dogmas são ridículos,
Visto saberes d'um mundo imutável.
Betim - 05 12 2018
terça-feira, 4 de dezembro de 2018
DESINTELIGÊNCIA POÉTICA
DESINTELIGÊNCIA POÉTICA
Uma metáfora de bloqueio criativo: A musa rompe com o poeta e ele fica sem inspiração.
Ele até escreve rimas, mas não sai poesia d'ali. Só DESINTELIGÊNCIA...
ANTIMUSA
Ordinária! Tu não vales
Do que comes nem o angu!...
Leva contigo teus males
Ou senão os põe no cu!
Sim: No teu que é mais redondo!
Se te doer, passa pomada...
Diz que foi um marimbondo,
Que te pôs descadeirada.
Vai chupar prego, vadia,
Até que vire tachinha!
Pagar pau dia após dia,
Que não passas d'uma zinha!
Tem de pôr fé n'essa zorra:
Puta formada pela USP!
Quando toma muita porra,
Engole tudo sem cuspe.
Vai te foder, boqueteira!
Eu sei bem o tu que fazes...
Pondo chifre à noite inteira;
De manhã fazendo as pazes!...
Olha, p'ra mim já deu. Vaza!
Volta p'ra quem te comeu...
Não quero ver n'essa casa
Nem sequer um cisco teu.
Aliás, só me incomoda
Uma coisa em tua merda:
Foste tonta a vida toda
Ou só te fazes de lerda?!
................................................
ANTIPOETA
Corno! Filho d'uma puta!!!
Eu que não mais fico aqui!
Lava a boca com cicuta,
Qu'estou bem melhor sem ti.
Fica sim, é teu direito:
Não quero nada contigo.
Isso tudo é só despeito
De cão que late e nem ligo.
O que fiz e o que não fiz
Já não é da tua conta.
Vou aonde sou feliz:
Nunca fui lerda nem tonta!
Quanto a ti, triste poeta,
És, no mínimo, um ingrato:
Não me amaste por discreta,
Tampouco pelo recato...
Boqueteira? Com prazer!
Faço bem! Faço gostoso!
Faço p'ra dar e receber,
Sobretudo com quem gozo.
A me foder, certo ou errado,
Lamentas não seres tu:
Andas muito preocupado
Do que ponho no meu cu...
Mas, sobretudo, se escreves
Sem a minha inspiração
Os versos a que te atreves
Têm rancor no coração.
Bebes litros de veneno
Sem veres minha agonia...
Pois sabes que ódio tão pleno
São rimas, mas não poesia.
Betim - 04 12 2018
segunda-feira, 3 de dezembro de 2018
CACÓFATO
CACÓFATO
Se ALMAMINHA fez célebre Camões
Sem ele dar-se conta que o escrevera,
Mais ainda se quis quem mal o lera
Alheio das mais doutas opiniões...
Ao terno vocativo e seus senões
Outra cousa um maldoso lh'entendera
E ainda outra quem d'ouvido em cera
Menos se lh'escutou que deu razões.
Se estragaram-lhe os versos tal galhofa
É que o besta à barriga mais estofa
Vendo o tolo sem cuidar da própria vida
Bah! Até os mestres erram... Quem diria?!
Diante d'outra leitura bem vadia
Ou senão d'alguma mente poluída!
Betim - 02 12 2008
Se ALMAMINHA fez célebre Camões
Sem ele dar-se conta que o escrevera,
Mais ainda se quis quem mal o lera
Alheio das mais doutas opiniões...
Ao terno vocativo e seus senões
Outra cousa um maldoso lh'entendera
E ainda outra quem d'ouvido em cera
Menos se lh'escutou que deu razões.
Se estragaram-lhe os versos tal galhofa
É que o besta à barriga mais estofa
Vendo o tolo sem cuidar da própria vida
Bah! Até os mestres erram... Quem diria?!
Diante d'outra leitura bem vadia
Ou senão d'alguma mente poluída!
Betim - 02 12 2008
ÍNCUBOS
ÍNCUBOS
Rogo-te: Não te deixes enganar
Pelo meu fugidio e distante olhar...
Sim, tenho estado atento!
Percebes que me movo pelas sombras
E inelutavelmente tu me assombras
A cada vão momento.
Não se turvem os verdes olhos teus
A especular de mim sonhos de Deus
Ou estradas para o Além.
Ao contrário, como o húmus mais escuro,
Eu às turfas dos charcos me afiguro
Já sem qualquer porém.
Matéria putrefeita das baixadas,
Onde forte neblinam alvas geadas,
-- Manhãs de imensidão --
Sou antes a memória enternecida
Do que julgaste vir d'uma outra vida,
Mas é teu coração.
Não sou senão lembrança que passeia
Por estradas rurais na lua cheia
Ou por casas vazias,
Como se humanidade que, incorpórea,
Carregasse o estandarte da vitória
Entre terras sombrias.
Cuida que te assovio em meio ao vento
Tanta melancolia onde o lamento
Harmoniza a saudade.
E entende que ainda que escondido
Tu verás o meu vulto presumido
Por toda essa cidade.
Madrugada, sozinha pela alcova,
Ainda teu desejo se renova
E buscas impassível
O calor de carícias tão antigas
Que do limbo me admiro que persigas
Minha boca impossível.
Sem embargo, suspirosa tu me chamas,
Tendo a mão sobre a vulva posta em chamas.
Como se a minha mão
Pousasse novamente em tuas coxas,
A ponto de deixar-te marcas roxas
Tamanha excitação.
A bela se desnuda feito ninfa
Ao gozo liquefeito todo em linfa
A encharcar-lhe o lençol.
No entanto seu amante evanescente
De seu quarto outra vez se fez ausente,
Logo ao raiar do sol.
Betim - 03 12 2018
Rogo-te: Não te deixes enganar
Pelo meu fugidio e distante olhar...
Sim, tenho estado atento!
Percebes que me movo pelas sombras
E inelutavelmente tu me assombras
A cada vão momento.
Não se turvem os verdes olhos teus
A especular de mim sonhos de Deus
Ou estradas para o Além.
Ao contrário, como o húmus mais escuro,
Eu às turfas dos charcos me afiguro
Já sem qualquer porém.
Matéria putrefeita das baixadas,
Onde forte neblinam alvas geadas,
-- Manhãs de imensidão --
Sou antes a memória enternecida
Do que julgaste vir d'uma outra vida,
Mas é teu coração.
Não sou senão lembrança que passeia
Por estradas rurais na lua cheia
Ou por casas vazias,
Como se humanidade que, incorpórea,
Carregasse o estandarte da vitória
Entre terras sombrias.
Cuida que te assovio em meio ao vento
Tanta melancolia onde o lamento
Harmoniza a saudade.
E entende que ainda que escondido
Tu verás o meu vulto presumido
Por toda essa cidade.
Madrugada, sozinha pela alcova,
Ainda teu desejo se renova
E buscas impassível
O calor de carícias tão antigas
Que do limbo me admiro que persigas
Minha boca impossível.
Sem embargo, suspirosa tu me chamas,
Tendo a mão sobre a vulva posta em chamas.
Como se a minha mão
Pousasse novamente em tuas coxas,
A ponto de deixar-te marcas roxas
Tamanha excitação.
A bela se desnuda feito ninfa
Ao gozo liquefeito todo em linfa
A encharcar-lhe o lençol.
No entanto seu amante evanescente
De seu quarto outra vez se fez ausente,
Logo ao raiar do sol.
Betim - 03 12 2018
domingo, 2 de dezembro de 2018
COMO UMA DAMA
COMO UMA DAMA
Quem bela, recatada e só do lar
Ou esperando o marido a procurar
Para lhe dar prazer...
Como do macho branco complemento
Busca se colocar todo momento
E não como mulher.
Mas sim cobiçadíssimo troféu
Com contrato de amor já no papel
E obrigação de amá-lo.
Aprendendo a sorrir-lhe o tempo todo
Como se estivesse ótima, de modo
A não pisar seu calo.
Ao contrário, paciente ainda espera
Ao menos uma flor na primavera
Ou beijos de Ano Bom.
A todos faz saber que são felizes,
Ainda que ocultando cicatrizes
Sob o tailleur marrom.
Mas o que mais dói é a indiferença...
É ele não pensar no qu'ela pensa
E por fim ignorá-la!
E mais tarde, ei-los diante dos olhares:
Enquanto ele lhe fala com bons ares,
Sorrindo, ela se cala.
Quem discreta, elegante e comedida,
S'empenha em parecer bem resolvida
Das escolhas que fez.
E o prazer que promete sua beleza
Vê como maldição da Natureza
Ou como carma, talvez.
Já de noite, sublimando seu desejo,
Recobre-se de sedas e de pejo
Deitada em sua cama
Sempre pronta para o receber
Ainda s'esforçando em parecer
Muda... Como uma dama!
Betim - 01 12 2018
Quem bela, recatada e só do lar
Ou esperando o marido a procurar
Para lhe dar prazer...
Como do macho branco complemento
Busca se colocar todo momento
E não como mulher.
Mas sim cobiçadíssimo troféu
Com contrato de amor já no papel
E obrigação de amá-lo.
Aprendendo a sorrir-lhe o tempo todo
Como se estivesse ótima, de modo
A não pisar seu calo.
Ao contrário, paciente ainda espera
Ao menos uma flor na primavera
Ou beijos de Ano Bom.
A todos faz saber que são felizes,
Ainda que ocultando cicatrizes
Sob o tailleur marrom.
Mas o que mais dói é a indiferença...
É ele não pensar no qu'ela pensa
E por fim ignorá-la!
E mais tarde, ei-los diante dos olhares:
Enquanto ele lhe fala com bons ares,
Sorrindo, ela se cala.
Quem discreta, elegante e comedida,
S'empenha em parecer bem resolvida
Das escolhas que fez.
E o prazer que promete sua beleza
Vê como maldição da Natureza
Ou como carma, talvez.
Já de noite, sublimando seu desejo,
Recobre-se de sedas e de pejo
Deitada em sua cama
Sempre pronta para o receber
Ainda s'esforçando em parecer
Muda... Como uma dama!
Betim - 01 12 2018
VISÃO PERIFÉRICA
VISÃO PERIFÉRICA
É diferente o olhar sobre a cidade
De quem a vê passar pela janela
D'outro ônibus ou trem que lhe revela
Todo dia uma dura realidade.
Acostumar-se co'a dificuldade
Que mais afasta o asfalto da favela
E ainda crer que assim se desmantela
A ordem piramidal da sociedade.
Longas horas perdidas no percurso
Questionam quem do mérito o discurso
Insiste em lançar mão para mandar.
A verdade é que aqui da periferia
A cidade mais parece a fantasia
Que julga pôr cada um em seu lugar...
Betim - 01 12 2018
É diferente o olhar sobre a cidade
De quem a vê passar pela janela
D'outro ônibus ou trem que lhe revela
Todo dia uma dura realidade.
Acostumar-se co'a dificuldade
Que mais afasta o asfalto da favela
E ainda crer que assim se desmantela
A ordem piramidal da sociedade.
Longas horas perdidas no percurso
Questionam quem do mérito o discurso
Insiste em lançar mão para mandar.
A verdade é que aqui da periferia
A cidade mais parece a fantasia
Que julga pôr cada um em seu lugar...
Betim - 01 12 2018
sexta-feira, 30 de novembro de 2018
EM NEGAÇÃO
EM NEGAÇÃO
Quem não faz nada nunca por ninguém
Parece negar a outrem a verdade
De que não há qualquer necessidade
De tratar tudo e todos com desdém.
Apenas o que mais se lhe convém
Faz, fazendo valer sua vontade:
Negada e renegada a liberdade,
Pois sempre d'olhos fitos para o Além.
Ainda que uma esperança assim conforte,
Vê estes que têm a alma malferida,
Como se nada nem ninguém importe.
Vivendo alheios à alheia dor vivida,
Já não em negação de sua morte,
Mas sim por negação da própria vida.
Betim - 30 11 2018
ANTIMUSA
ANTIMUSA
Ordinária! Tu não vales
Do que comes nem o angu!...
Leva contigo teus males
Ou senão os põe no cu!
Sim: No teu que é mais redondo!
Se te doer, passa pomada...
Diz que foi um marimbondo,
Que te pôs descadeirada.
Vai chupar prego, vadia,
Até que vire tachinha!
Pagar pau dia após dia,
Que não passas d'uma zinha!
Tem de pôr fé n'essa zorra:
Puta formada pela USP!
Quando toma muita porra,
Engole tudo sem cuspe.
Vai te foder, boqueteira!
Eu sei bem o tu que fazes...
Pondo chifre à noite inteira;
De manhã fazendo as pazes!...
Olha, p'ra mim já deu. Vaza!
Volta p'ra quem te comeu...
Não quero ver n'essa casa
Nem sequer um cisco teu.
Aliás, só me incomoda
Uma coisa em tua merda:
Foste tonta a vida toda
Ou só te fazes de lerda?!
Betim - 30 11 2018
SINGULARIDADE
SINGULARIDADE
Surrealizo os teus olhos feito estrelas
E atravesso as galáxias de teu verso...
Pelas letras, recrio outro Universo
Onde estás bem no centro das querelas!
Em fuga, duas linhas paralelas
Reúnem no infinito o haver disperso.
De modo que contigo desconverso
Sobre eu ser lar de múltiplas janelas.
Espaço-tempo d'um buraco negro
De cujos mil megatons me desintegro,
A ponto de deformar matéria escura.
E mesmo a luz se curva ora atraída
Àquela gravidade desmedida
Que bem dentro de ti se transfigura.
Betim - 29 11 2018
Surrealizo os teus olhos feito estrelas
E atravesso as galáxias de teu verso...
Pelas letras, recrio outro Universo
Onde estás bem no centro das querelas!
Em fuga, duas linhas paralelas
Reúnem no infinito o haver disperso.
De modo que contigo desconverso
Sobre eu ser lar de múltiplas janelas.
Espaço-tempo d'um buraco negro
De cujos mil megatons me desintegro,
A ponto de deformar matéria escura.
E mesmo a luz se curva ora atraída
Àquela gravidade desmedida
Que bem dentro de ti se transfigura.
Betim - 29 11 2018
quarta-feira, 28 de novembro de 2018
BACANÁLIA
BACANÁLIA
-- "Evoé, filhas de Baco! Vós que haveis
Dos mistérios do vinho as sábias leis;
E do êxtase divino!
Sede afinal bem-vindas! Adentrai
A ensinar-nos o poder de vosso pai
Sobre os vãos do Destino."
"Alegrai-vos e alegrai-nos, todavia,
Antes que nos retorne a luz do dia
A revelar excessos.
Concedei, embriagadas de luxúria,
Vossas bocetas húmidas em fúria
A devassos confessos!"
"À maneira de ninfas seminuas,
Vinde nos receber carícias cruas
De cada rude mão.
Visto que, indiferente de quem toca,
Sabeis por fim deixar de boca em boca
Do Deus Baco a ilusão."
"Entretidas também com nossos sexos,
Vêm deixar-nos malucos e perplexos
Vossas habilidades:
Deveras, com total desembaraço
Levais um após outro pelo braço,
Tomando liberdades..."
"Depois de saudação tão eloquente
A vós me apresento tão-somente
Como vosso anfitrião.
Vós-outros, companheiros de gandaia,
Peço antes que das belas cada alfaia
Vede se sim ou não."
"Com efeito, aqui mandam as bacantes!
Elas conduzirão, por delirantes,
As artes do prazer.
Aquele que as ferir ou molestar,
O quanto antes nos deixe este lugar
E após vá se foder!"
"Elas, o que quiserem faço lei.
Pois d'elas sou escravo, nunca rei,
Durante esse festim.
Em honra do grã-deus que em vinho adoro
A vós, Filhas de Baco, eu vos imploro,
Que reineis sobre mim..."
"Trazei para estes prados os delírios
Em procissão d'archotes e de círios
Por sob a lua plena.
Em pele de pantera ou de tigresa,
Às forças seminais da Natureza
Buscai na noite amena."
"Coroadas de grinaldas d'heras verdes,
Sois rainhas a fazer o que quiserdes
N'essas lides d'amor.
Tirso em punho, ordenai a bebedeira
Jorrando o doce sumo da videira
A nos dar mais ardor."
"Mênades desejosas! Sabei qu'eu
Não quedo lamuriento feito Orfeu,
Embora também poete.
Vinde me devorar, mas de prazeres.
Gozando de meu ser, lindas mulheres,
Em singular banquete!"
"Cultoras devotíssimas de Priapo,
Eis em plena ereção o membro guapo
A vos servir de gozo.
Levai-o a conhecer as vossas grutas
Remediando-me em fodas dissolutas
O tédio venenoso."
"Ide e fodei com quem mais vos apraz
Quer seja rapariga; quer rapaz,
Até cairdes saciadas.
Assim, toda a verdade que há no vinho
Se revele por fim no desalinho
Das bocetas sagradas."
Betim - 28 11 2018
terça-feira, 27 de novembro de 2018
À TRAVESTIDA
À TRAVESTIDA
(sextina: pênis, seios, nádegas, ânus, pelo, pele)
Linda… Fatal mulher além do pênis!…
Seu dote… Viril homem mais os seios!…
Mas na parábola audaz de suas nádegas
Perdi-me ao explorar o seu doce ânus!
Meus dedos pelo seu corpo sem pelo
Desnudam impacientes toda a pele…
Sentindo o seu calor à flor da pele
Enquanto topo túrgido seu pênis.
Incontinente, já lhe monto em pelo:
Estreito pelas mãos seus fartos seios,
Pincelo doce e húmido seu ânus
E o penetro violento pelas nádegas.
Por amplas e douradas, suas nádegas
Parecem rebrilhar a suave pele
A ocultar, caprichosas, seu doce ânus
Das firmes investidas de meu pênis
--Qual aríete ao pórtico!-- Seus seios
S'eriçam onde a barba corre o pelo…
Ela se m'embaraça o basto pelo
Do púbis ao marcar às suas nádegas.
Embriago-me a beber d'esses seus seios
Até qu'ela, rasgando a minha pele,
Me invada loucamente com seu pênis
E m'o penetre todo no meu ânus!…
Desvairada em possuir-me pelo ânus,
Agora ela, amazona, monta em pelo!
N'uma célere marcha, logo o pênis
Cavalga-me bem forte sobre as nádegas
Ávida de incendiar-me toda a pele
Roçando minhas costas com os seios.
Exaure-se meu pênis por seus seios!
Extenue-me as nádegas pelo ânus!
Até deixar meu pelo em sua pele!…
Betim - 27 11 2018
(sextina: pênis, seios, nádegas, ânus, pelo, pele)
Linda… Fatal mulher além do pênis!…
Seu dote… Viril homem mais os seios!…
Mas na parábola audaz de suas nádegas
Perdi-me ao explorar o seu doce ânus!
Meus dedos pelo seu corpo sem pelo
Desnudam impacientes toda a pele…
Sentindo o seu calor à flor da pele
Enquanto topo túrgido seu pênis.
Incontinente, já lhe monto em pelo:
Estreito pelas mãos seus fartos seios,
Pincelo doce e húmido seu ânus
E o penetro violento pelas nádegas.
Por amplas e douradas, suas nádegas
Parecem rebrilhar a suave pele
A ocultar, caprichosas, seu doce ânus
Das firmes investidas de meu pênis
--Qual aríete ao pórtico!-- Seus seios
S'eriçam onde a barba corre o pelo…
Ela se m'embaraça o basto pelo
Do púbis ao marcar às suas nádegas.
Embriago-me a beber d'esses seus seios
Até qu'ela, rasgando a minha pele,
Me invada loucamente com seu pênis
E m'o penetre todo no meu ânus!…
Desvairada em possuir-me pelo ânus,
Agora ela, amazona, monta em pelo!
N'uma célere marcha, logo o pênis
Cavalga-me bem forte sobre as nádegas
Ávida de incendiar-me toda a pele
Roçando minhas costas com os seios.
Exaure-se meu pênis por seus seios!
Extenue-me as nádegas pelo ânus!
Até deixar meu pelo em sua pele!…
Betim - 27 11 2018
ALCATEIA
ALCATEIA
Bem-vindos aos recônditos da noite
-- E a salvo d'esponsal e rudo açoite... --
Avançam entre os reles
Cavalheiros viris de meia idade
Buscando os lupanares da cidade,
Pois lobos também eles!
Homens d'excelentíssimas maneiras
Vestidos com as galas costumeiras
Dos que sabem se impor.
Visto bem sucedidos nos negócios,
Em conluio d'amigos e de sócios
Renovam-se o vigor.
Adentram o covil das meretrizes
No afã d'haverem horas mais felizes
Que as que têm em família.
Ou ainda, co'os rigores dos estetas,
Ranquearem a doçura das bocetas
Com graça peralvilha.
Pois em meio à fumaça dos charutos
Cortejam-nas com brindes dissolutos;
Cascatas de champanha!
Na berlinda, o desfile das beldades:
Ao exibir do plantel as novidades
Toda a malta se assanha...
Vêm vestidas de rendas e de plumas
Ou totalmente nuas entre espumas
As belas raparigas.
Seus olhos, feito joias cintilantes,
Desdenham dos amores inconstantes
Ou de suas intrigas.
Sorriem a inspirar deslumbramentos,
Fazendo-os suspirar pelos momentos
De tê-las em seus braços:
Saborear das mais jovens as delícias
Ou das dominatrizes as sevícias
Em seus corpos devassos.
Mas antes, desfraldada igual bandeira
A dançarina se exibe de maneira
A atrair longos olhares:
Presa ao poste de dança, toda nua,
Entre caras e bocas se insinua
Co'as poses mais vulgares.
Assim, uma após a outra no espetáculo
As belas se revezam ao pináculo
Já ultraprovocantes!
Pois é de se admirar homens tão probos
Súbito se tornando velhos lobos
A uivar-lhes suplicantes...
Tão-logo as moças deixam a berlinda
Tais senhores lhes vêm cercar ainda
A dar mundos e fundos.
Atentas, elas ouvem as promessas
Como estivesse o mundo ora às avessas
Em seus olhos profundos.
Suaves, concordam elas bem com tudo,
Oferecendo o peito já desnudo
Ao alcance d'outra mão.
Como se já ansiassem pelo toque
E que tal perfeição n'eles provoque
A mais doce paixão.
Eles, homens deveras bem vividos,
Fingem acreditar nos seus ouvidos,
Devolvendo elogios.
Elas, mulheres muito espirituosas,
Tentam logo arrastá-los entre rosas,
Sussurros e arrepios...
Certos que a vida é mais do que uma ideia,
Os velhos lobos vão em alcateia
Coleccionar prazeres.
Gozosos de passar por tantos leitos,
Voltam ao fim da noite satisfeitos
Para suas mulheres...
Belo Horizonte - 26 11 2018
Bem-vindos aos recônditos da noite
-- E a salvo d'esponsal e rudo açoite... --
Avançam entre os reles
Cavalheiros viris de meia idade
Buscando os lupanares da cidade,
Pois lobos também eles!
Homens d'excelentíssimas maneiras
Vestidos com as galas costumeiras
Dos que sabem se impor.
Visto bem sucedidos nos negócios,
Em conluio d'amigos e de sócios
Renovam-se o vigor.
Adentram o covil das meretrizes
No afã d'haverem horas mais felizes
Que as que têm em família.
Ou ainda, co'os rigores dos estetas,
Ranquearem a doçura das bocetas
Com graça peralvilha.
Pois em meio à fumaça dos charutos
Cortejam-nas com brindes dissolutos;
Cascatas de champanha!
Na berlinda, o desfile das beldades:
Ao exibir do plantel as novidades
Toda a malta se assanha...
Vêm vestidas de rendas e de plumas
Ou totalmente nuas entre espumas
As belas raparigas.
Seus olhos, feito joias cintilantes,
Desdenham dos amores inconstantes
Ou de suas intrigas.
Sorriem a inspirar deslumbramentos,
Fazendo-os suspirar pelos momentos
De tê-las em seus braços:
Saborear das mais jovens as delícias
Ou das dominatrizes as sevícias
Em seus corpos devassos.
Mas antes, desfraldada igual bandeira
A dançarina se exibe de maneira
A atrair longos olhares:
Presa ao poste de dança, toda nua,
Entre caras e bocas se insinua
Co'as poses mais vulgares.
Assim, uma após a outra no espetáculo
As belas se revezam ao pináculo
Já ultraprovocantes!
Pois é de se admirar homens tão probos
Súbito se tornando velhos lobos
A uivar-lhes suplicantes...
Tão-logo as moças deixam a berlinda
Tais senhores lhes vêm cercar ainda
A dar mundos e fundos.
Atentas, elas ouvem as promessas
Como estivesse o mundo ora às avessas
Em seus olhos profundos.
Suaves, concordam elas bem com tudo,
Oferecendo o peito já desnudo
Ao alcance d'outra mão.
Como se já ansiassem pelo toque
E que tal perfeição n'eles provoque
A mais doce paixão.
Eles, homens deveras bem vividos,
Fingem acreditar nos seus ouvidos,
Devolvendo elogios.
Elas, mulheres muito espirituosas,
Tentam logo arrastá-los entre rosas,
Sussurros e arrepios...
Certos que a vida é mais do que uma ideia,
Os velhos lobos vão em alcateia
Coleccionar prazeres.
Gozosos de passar por tantos leitos,
Voltam ao fim da noite satisfeitos
Para suas mulheres...
Belo Horizonte - 26 11 2018
segunda-feira, 26 de novembro de 2018
AGUADAS
AGUADAS
A chuva e seu pincel de fantasia
Dão ao vale horizontes desmedidos,
Onde os olhos se perdem comovidos
Ao longo já de toda a travessia.
Mas mais bonito mesmo é quando estia
E os campos do Senhor, reverdecidos,
Parecem rebrilhar agradecidos
Às águas que caíram noite e dia.
A luz do sol s'espalha quase pura
E o céu em pleno azul se transfigura
Por sobre o rio cheio que o espelha.
Felizes, companheiros do lugar
Às culturas do tempo vêm plantar,
E fecundar a chã terra vermelha!
Pará de Minas - 26 11 2017
A chuva e seu pincel de fantasia
Dão ao vale horizontes desmedidos,
Onde os olhos se perdem comovidos
Ao longo já de toda a travessia.
Mas mais bonito mesmo é quando estia
E os campos do Senhor, reverdecidos,
Parecem rebrilhar agradecidos
Às águas que caíram noite e dia.
A luz do sol s'espalha quase pura
E o céu em pleno azul se transfigura
Por sobre o rio cheio que o espelha.
Felizes, companheiros do lugar
Às culturas do tempo vêm plantar,
E fecundar a chã terra vermelha!
Pará de Minas - 26 11 2017
domingo, 25 de novembro de 2018
HOMO EROTICUS
HOMO EROTICUS
Quem sabe que quer Deus pelos seus planos,
Senão fazer dos homens mais humanos
A ponto que se toquem??
Ou será que o desejo não vem d'Ele
E os ardores que tenho à flor da pele
Tão-só males provoquem?...
O que sei é que o Amor, divino ou não,
Me fez com que buscasse a tua mão
Pousada sobre a minha.
E que, contados todos os segredos,
Eu sentisse na ponta de teus dedos
Passar a estreita linha...
Entre beijos por fim reconhecer
Que estava todo ali a te querer,
Entregue a tuas carícias.
E ainda, sem passado e sem porvir,
Eu por todo o teu corpo descobrir
Um jardim de delícias!
Na novidade doce de teu sexo,
Eu perceber-me ávido e perplexo
No afã que me possuas.
E, na força de tuas carnes rijas,
Saber que tu em mim te regozijas
Por nossas peles nuas.
E depois, reclinado no teu peito,
Te veja espreguiçado pelo leito
Buscar a minha boca.
Sentir que tu de novo me desejas
Quando, pelo vigor com que me beijas,
O teu sexo o meu toca.
Mas agora, descendo por meu ventre,
No meu gozo somente se concentre
A tua boca cálida.
Ao que minha mirada se arregala
A ver tu espalhares minha gala
Por tua pele pálida.
Ah! Queira Deus que tu 'inda me queiras
Por ardor ou quaisquer outras besteiras
De novo aos braços teus.
E esse Amor que nos toma tão imenso
A repetir-se ainda mais intenso,
Também seja de Deus!...
Betim - 25 11 2018
sábado, 24 de novembro de 2018
O TALARICO
O TALARICO
Tarde demais, o amigo se mostra um...
Ou melhor, que jamais foi mesmo amigo.
Até tento entender, mas não consigo
Quem se reduz a ser lugar-comum!
Hoje não é ninguém quem foi nenhum
Dos que um dia evitou andar comigo.
Ao contrário, de mim pediu abrigo,
Fazendo de meu pão seu desjejum.
Mas s'entreteve com minha mulher:
Enquanto ela buscava m'esquecer,
Ele esquecia tudo o qu'eu lhe fiz.
Hoje só lhe devoto o mais frio ódio
Sempre que recordo do episódio...
Que mais posso fazer d'esse infeliz?
Betim - 12 02 2014
GINECEU
GINECEU
Bela entre as belas, ela se deleita
Em vê-las todas nuas e agitadas:
Pernas, coxas e mãos entrelaçadas
Sem que possa dizer a mais perfeita!
Já essa sobre aquela ali se deita
Ao passo que aquel'outras, perfumadas,
Vêm se trocar carícias delicadas
E também ela beija à sua eleita.
A rainha, resguardada por eunucos,
Apraz-se em companhia de donzelas
Longe do velho rei entre caducos.
E alheia à toda Corte, junto d'elas
S'entregava aos desejos mais malucos...
Feliz d'estar ali, bela entre as belas.
Belo Horizonte - 24 11 2018
Bela entre as belas, ela se deleita
Em vê-las todas nuas e agitadas:
Pernas, coxas e mãos entrelaçadas
Sem que possa dizer a mais perfeita!
Já essa sobre aquela ali se deita
Ao passo que aquel'outras, perfumadas,
Vêm se trocar carícias delicadas
E também ela beija à sua eleita.
A rainha, resguardada por eunucos,
Apraz-se em companhia de donzelas
Longe do velho rei entre caducos.
E alheia à toda Corte, junto d'elas
S'entregava aos desejos mais malucos...
Feliz d'estar ali, bela entre as belas.
Belo Horizonte - 24 11 2018
sexta-feira, 23 de novembro de 2018
MONTE DE VÊNUS
MONTE DE VÊNUS
De tua geografia explorador
Tornei-me entusiasmado e persistente.
Não raro te desnudo tão-somente
Para te ver corar tanto candor...
E descubro, por sob o teu pudor,
Toda uma natureza esplandecente.
Onde vales, planícies e a vertente
Que tenho palmilhado com ardor:
Em leve elevação, eis o áureo monte
D'onde se descortina esse horizonte
Esplêndido de curvas venturosas.
Mas onde, sobretudo, aquela gruta
Cuja lenda e mistério mais s'escuta
Como a fonte de néctar entre rosas!
Betim - 23 11 2018
De tua geografia explorador
Tornei-me entusiasmado e persistente.
Não raro te desnudo tão-somente
Para te ver corar tanto candor...
E descubro, por sob o teu pudor,
Toda uma natureza esplandecente.
Onde vales, planícies e a vertente
Que tenho palmilhado com ardor:
Em leve elevação, eis o áureo monte
D'onde se descortina esse horizonte
Esplêndido de curvas venturosas.
Mas onde, sobretudo, aquela gruta
Cuja lenda e mistério mais s'escuta
Como a fonte de néctar entre rosas!
Betim - 23 11 2018
ERÓGENO
ERÓGENO
Quente... Se a pele arde onde o dedo toca,
Também a tua língua em minha boca
Vem sibilar veneno...
Logo, descem os lábios aos mamilos
E assim, vêm pousar ali tranquilos
Onde o prazer é pleno.
Na fome de te amar, quase machuca
Eu te cravar os dentes pela nuca
Para te devorar.
E, após correr as unhas pelos ombros,
Embaixo te sucedem os assombros
Do longo dedilhar.
Húmida... Se oferece à minha língua
A gruta até aqui deixada à míngua
Por sob os bastos pelos.
Para então, revirada sem esforço,
Mais arquear tuas costas sobre o dorso
Puxando-te os cabelos!
E, ao descer pelas nádegas expostas,
Te degustar enquanto te desgostas
Por eu tatear-te, cego.
E toda entregue ali tu te abandonas
À língua que t'explora aquelas zonas
Passear-te pelo rego...
E mais, untados todos os teus poros,
T'escutar os gemidos tão sonoros
A ponto de os temer.
Pois, lânguida, te alongas empinada
E reviras teus olhos desvairada
Quase a desfalecer
Contudo, sem perderes os sentidos
Mais ainda me sentes incontidos
Os ousados carinhos
E mais me aceitas pela pele os lábios
Ao fazer de teus seios menos sábios
Ainda mais vizinhos...
Sim! Goza de meu corpo junto ao teu...
Usufrui de mim tal como se eu
Fosse tu mesma tua
Recebe-me o calor em teu calor
A nos queimarmos juntos pelo ardor
Por toda a pele nua.
Betim - 23 11 2018
Quente... Se a pele arde onde o dedo toca,
Também a tua língua em minha boca
Vem sibilar veneno...
Logo, descem os lábios aos mamilos
E assim, vêm pousar ali tranquilos
Onde o prazer é pleno.
Na fome de te amar, quase machuca
Eu te cravar os dentes pela nuca
Para te devorar.
E, após correr as unhas pelos ombros,
Embaixo te sucedem os assombros
Do longo dedilhar.
Húmida... Se oferece à minha língua
A gruta até aqui deixada à míngua
Por sob os bastos pelos.
Para então, revirada sem esforço,
Mais arquear tuas costas sobre o dorso
Puxando-te os cabelos!
E, ao descer pelas nádegas expostas,
Te degustar enquanto te desgostas
Por eu tatear-te, cego.
E toda entregue ali tu te abandonas
À língua que t'explora aquelas zonas
Passear-te pelo rego...
E mais, untados todos os teus poros,
T'escutar os gemidos tão sonoros
A ponto de os temer.
Pois, lânguida, te alongas empinada
E reviras teus olhos desvairada
Quase a desfalecer
Contudo, sem perderes os sentidos
Mais ainda me sentes incontidos
Os ousados carinhos
E mais me aceitas pela pele os lábios
Ao fazer de teus seios menos sábios
Ainda mais vizinhos...
Sim! Goza de meu corpo junto ao teu...
Usufrui de mim tal como se eu
Fosse tu mesma tua
Recebe-me o calor em teu calor
A nos queimarmos juntos pelo ardor
Por toda a pele nua.
Betim - 23 11 2018
quinta-feira, 22 de novembro de 2018
BODAS DE CIANURETO
BODAS DE CIANURETO
Romântico a meu modo, eu não me oponho
A morrer já de mãos dadas contigo.
Bebamos outra dose de perigo,
Baforando tragadas d'algum sonho.
Pego-me a te admirar assim tristonho
Como se fosse um íntimo inimigo
Capaz de te acolher no mesmo abrigo
Onde oculto do ser meu mais bisonho:
-- "Que preferes, champanha ou cianureto?"
À maneira do músico eu te poeto,
Fazendo graça com nossa tristeza.
No mais, comemoremos estas bodas
'Pós-excessos das mais bizarras fodas,
Mareados sob um céu azul turquesa.
Betim - 22 11 2018
Romântico a meu modo, eu não me oponho
A morrer já de mãos dadas contigo.
Bebamos outra dose de perigo,
Baforando tragadas d'algum sonho.
Pego-me a te admirar assim tristonho
Como se fosse um íntimo inimigo
Capaz de te acolher no mesmo abrigo
Onde oculto do ser meu mais bisonho:
-- "Que preferes, champanha ou cianureto?"
À maneira do músico eu te poeto,
Fazendo graça com nossa tristeza.
No mais, comemoremos estas bodas
'Pós-excessos das mais bizarras fodas,
Mareados sob um céu azul turquesa.
Betim - 22 11 2018
DESAPEGO
DESAPEGO
Deixo de te querer para que partas
E enfim possas amar alguém de novo.
Se os votos do passado não renovo
É antes por sabê-los velhas cartas...
Certo que tu de mim logo te apartas,
Aceito-o, mas ainda me comovo.
Não obstante é bem como diz o povo:
De males as pessoas andam fartas!
Volta a sorrir, ainda qu'eu te chore
Debalde uma saudade sem remédio
Ou a solidão por vezes me apavore.
Cuida apenas de assim matar o tédio
E impedir que tristeza te descore,
Vivendo tudo o mais sem intermédio.
Betim - 21 11 2018
Deixo de te querer para que partas
E enfim possas amar alguém de novo.
Se os votos do passado não renovo
É antes por sabê-los velhas cartas...
Certo que tu de mim logo te apartas,
Aceito-o, mas ainda me comovo.
Não obstante é bem como diz o povo:
De males as pessoas andam fartas!
Volta a sorrir, ainda qu'eu te chore
Debalde uma saudade sem remédio
Ou a solidão por vezes me apavore.
Cuida apenas de assim matar o tédio
E impedir que tristeza te descore,
Vivendo tudo o mais sem intermédio.
Betim - 21 11 2018
quarta-feira, 21 de novembro de 2018
ESTROBOSCÓPIA
ESTROBOSCÓPIA
Mostra-se quadro a quadro ou fotograma,
Como que congelando o movimento.
Somente a iluminar cada momento
No instante que o lampejo se derrama.
Sequência de instantâneos cujo drama
Põe entre claro e escuro um andamento.
Onde o corpo à luz do pensamento
Diverso espaço-tempo a si proclama.
Em longa exposição se lhe captura
A trajetória toda n'um só plano,
Fazendo o passo a passo da figura.
E se, por cinemático esse engano,
Revelar-se inusual nomenclatura,
Far-se-á tão-só de luzes outro humano.
Betim - 21 11 2018
Mostra-se quadro a quadro ou fotograma,
Como que congelando o movimento.
Somente a iluminar cada momento
No instante que o lampejo se derrama.
Sequência de instantâneos cujo drama
Põe entre claro e escuro um andamento.
Onde o corpo à luz do pensamento
Diverso espaço-tempo a si proclama.
Em longa exposição se lhe captura
A trajetória toda n'um só plano,
Fazendo o passo a passo da figura.
E se, por cinemático esse engano,
Revelar-se inusual nomenclatura,
Far-se-á tão-só de luzes outro humano.
Betim - 21 11 2018
terça-feira, 20 de novembro de 2018
DÂNAE
DÂNAE
Chuvas d'ouro lhe jorram sobre o sexo...
Pois quando os deuses amam, generosas,
Suas mãos amantes lhe ofertem rosas
Ou, se forçoso for, o áureo amplexo!
À ninfa enclausurada vem perplexo
Honrar com suas galas vigorosas.
Ao fecundá-la tanto quanto esposas,
Lhe goza entre palavras já sem nexo.
Em resposta, ela verte a sua linfa
N'outra chuva prateada pois de ninfa,
Onde ejacula a gala feminina.
E mais a sua fúria se agiganta,
Entumescida a vagina sacrossanta
Que em chamas de prazer tudo ilumina.
Betim - 20 11 2018
Chuvas d'ouro lhe jorram sobre o sexo...
Pois quando os deuses amam, generosas,
Suas mãos amantes lhe ofertem rosas
Ou, se forçoso for, o áureo amplexo!
À ninfa enclausurada vem perplexo
Honrar com suas galas vigorosas.
Ao fecundá-la tanto quanto esposas,
Lhe goza entre palavras já sem nexo.
Em resposta, ela verte a sua linfa
N'outra chuva prateada pois de ninfa,
Onde ejacula a gala feminina.
E mais a sua fúria se agiganta,
Entumescida a vagina sacrossanta
Que em chamas de prazer tudo ilumina.
Betim - 20 11 2018
domingo, 18 de novembro de 2018
NÓS COMO VÓS
NÓS COMO VÓS
Também nós temos sangue sob a pele
-- Vermelho, não azul como sonhais... --
Mas, derramados, correm tão iguais,
Que sequer se distingue este d'aquele.
Entre nós e vós, tal sangue enfim revele
Menos as diferenças do que os ais
E mostre que todos perdem mais
Quando o afã de vitórias os impele.
Nós como vós havemos-de morrer,
Andando n'esse mundo sem saber
Aonde se vai dar com tanta briga.
O certo é respeitar a liberdade
E sorrir sem ser dono da verdade
Àquele que m'estende a mão amiga.
Belo Horizonte - 17 11 2018
Também nós temos sangue sob a pele
-- Vermelho, não azul como sonhais... --
Mas, derramados, correm tão iguais,
Que sequer se distingue este d'aquele.
Entre nós e vós, tal sangue enfim revele
Menos as diferenças do que os ais
E mostre que todos perdem mais
Quando o afã de vitórias os impele.
Nós como vós havemos-de morrer,
Andando n'esse mundo sem saber
Aonde se vai dar com tanta briga.
O certo é respeitar a liberdade
E sorrir sem ser dono da verdade
Àquele que m'estende a mão amiga.
Belo Horizonte - 17 11 2018
sexta-feira, 16 de novembro de 2018
LUA À MÍNGUA
LUA À MÍNGUA
Decresce pelo céu a lua ao meio,
Desanuviando a noite dos sertões.
Da mata, um uratau geme canções
Bisonhas e com uivos de permeio.
Embaraçada pelo seu gorjeio,
A lua fica à míngua em seus clarões...
Vai minguando minguante aos corações
Desiludidos já d'algum enleio.
Tal luar antes esconde que revela,
A encher de densas sombras os caminhos
Por onde o enamorado se desvela.
Tristes, o mãe-da-lua e os passarinhos,
Vendo a lua minguar tão menos bela,
Deixam esses desertos mais sozinhos...
Betim - 15 11 2018
Decresce pelo céu a lua ao meio,
Desanuviando a noite dos sertões.
Da mata, um uratau geme canções
Bisonhas e com uivos de permeio.
Embaraçada pelo seu gorjeio,
A lua fica à míngua em seus clarões...
Vai minguando minguante aos corações
Desiludidos já d'algum enleio.
Tal luar antes esconde que revela,
A encher de densas sombras os caminhos
Por onde o enamorado se desvela.
Tristes, o mãe-da-lua e os passarinhos,
Vendo a lua minguar tão menos bela,
Deixam esses desertos mais sozinhos...
Betim - 15 11 2018
quarta-feira, 14 de novembro de 2018
NAU ANUNCIAÇÃO
NAU ANUNCIAÇÃO
Navega a todo pano em mar aberto
Uma nau de três mastros transoceânica.
Desdenha de Neptuno a voz tirânica
Nas vagas a reter-lhe o curso certo.
Contorna um continente indescoberto,
Ao lago d'outra vã ilha vulcânica...
A conhecer dos ventos a mecânica
Até ter o distante como perto.
E segue, para além do que há nas cartas,
Veloz feito um corcel pela campina
Por topar terras tórridas e fartas.
Tão-logo chega aonde se destina
-- Ou aonde descobriu ter de chegar --
Reúne enfim as terras pelo mar!...
Betim - 13 11 2018
Navega a todo pano em mar aberto
Uma nau de três mastros transoceânica.
Desdenha de Neptuno a voz tirânica
Nas vagas a reter-lhe o curso certo.
Contorna um continente indescoberto,
Ao lago d'outra vã ilha vulcânica...
A conhecer dos ventos a mecânica
Até ter o distante como perto.
E segue, para além do que há nas cartas,
Veloz feito um corcel pela campina
Por topar terras tórridas e fartas.
Tão-logo chega aonde se destina
-- Ou aonde descobriu ter de chegar --
Reúne enfim as terras pelo mar!...
Betim - 13 11 2018
segunda-feira, 12 de novembro de 2018
UNS TRINTA MIL
UNS TRINTA MIL
Reunidos na Avenida Paulista, uns trinta mil estendem uma faixa de papel pardo.
Ontem à noite, eu tive um sonho bem gozado. Sonhei com uma fila indiana de três quilômetros na Avenida Paulista fazendo um acto público em pleno primeiro de janeiro de dois mil e dezenove. Uns trinta mil vestidos de preto-luto que estendiam uma faixa de papel pardo igualmente quilométrica por toda a extensão da fila. Uns trinta mil reunidos, sem cores partidárias, símbolos religiosos ou qualquer forma d’expressão ideológica… Apenas pessoas de preto em silêncio. E de mãos dadas.
Na ressaca do feriado do Ano Novo, a megalópole sulamericana é surpreendida pelo inusitado — “Quem são aquelas pessoas?” — pergunta quem passa diante da faixa de papel pardo que demanda uma caminhada de cerca de três mil metros para ser lida. Alguns se animam a ler o que está escrito e, após os primeiros metros, já se dão conta de que o conteúdo era realmente subversivo:
AQUI EM SÃO PAULO, NO DIA PRIMEIRO DE JANEIRO DE DOIS MIL E DEZENOVE, SE REÚNEM, ENTRE HOMENS E MULHERES, UNS TRINTA MIL. ESTAMOS AQUI PARA OFERECER AS NOSSAS MORTES EM LUGAR DAS TRINTA MIL QUE SE ACREDITA NECESSÁRIAS PARA TORNAR O BRASIL UM PAÍS VIÁVEL, HAJA VISTA QUE NESSE MESMO PAIS, HÁ CERCA DE QUARENTA ANOS ATRÁS, TORTURAR EM PORÕES NÃO TENHA SIDO O BASTANTE. SOMOS MILITANTES PELOS DIREITOS HUMANOS, ATIVISTAS LGBT, COLETIVOS DE PERIFERIAS, ARTISTAS, INDÍGENAS, OPERÁRIOS, QUILOMBOLAS, PROFESSORES, POLÍTICOS, LIDERANÇAS DE MOVIMENTOS SOCIAIS, RELIGIOSOS, DESEMPREGADOS, INTELECTUAIS, MILITARES, DEPENDENTES QUÍMICOS, MORADORES DE RUA, UNIVERSITÁRIOS, SERVIDORES PÚBLICOS, JORNALISTAS, ESPORTISTAS, PROFISSIONAIS LIBERAIS ETC… MAS, ANTES DE TUDO, PATRIOTAS! ESCOLHEMOS OFERECER-NOS NUM GESTO APLACADOR DO ÓDIO QUE DOMINA A NAÇÃO. SE UNS TRINTA MIL NECESSITAM MORRER, QUE SEJAMOS NÓS, QUE DESDE O INÍCIO NOS COLOCAMOS COMO RESISTÊNCIA A ESSE ESTADO DE COISAS QUE OPRIME AS MINORIAS PELO MEDO E PELA INTIMIDAÇÃO. SE UNS TRINTA MIL NECESSITAM MORRER, QUE SEJAMOS NÓS, QUE JÁ NOS PERCEBEMOS COMO VOZ DISSONANTE A SER EMUDECIDA. NÃO NOS INTERESSA VIVER NUM PAÍS QUE NOS EXCLUI OU NOS CULPA E QUE NOS MATARÁ AOS POUCOS “DE FOME, DE RAIVA E DE SEDE”. MATEM-NOS, UNS TRINTA MIL, DE UMA VEZ SÓ. FAÇAM A LIMPEZA GENOCIDA QUE ACREDITAM PRECISAR SER FEITA E LEVEM O PAÍS — SEM NÓS — A UMA NOVA ERA DE PROSPERIDADE, SOB PENA DE AGUÇAR AINDA MAIS A EXTREMA DESIGUALDADE DO BRASIL. NACIONALISTAS ÀS AVESSAS, NEGOCIEM NOSSAS JAZIDAS, NOSSAS FLORESTAS E NOSSO CHÃO. REFAÇAM O PACTO SOCIAL NUMA DEMOCRACIA À SOBRA DE FUZIS. NINGUÉM RECLAME. NINGUÉM SE MANIFESTE. SILENCIEM-NOS DE VEZ: MATEM-NOS, UNS TRINTA MIL. ENVIEM SUAS TROPAS DE CHOQUE E SEUS ESQUADRÕES DA MORTE. ESTABELEÇAM NOS MORROS A PAZ DE CEMITÉRIO QUE ANSEIAM NO ASFALTO. DOMINEM PELO MEDO, TOLERANDO MILÍCIAS ASSASSINAS SIAMESAS DE FORÇAS POLICIAS. METRALHEM. SOMOS UNS TRINTA MIL EM FILA, À VISTA DE TUDO E DE TODOS, EM PLENA AVENIDA, CERTOS DE NÃO COLABORAR COM MEDIDAS DE EXCEÇÃO; DE NÃO PACTUAR COM UMA JUSTIÇA NÃO VÊ CRIME EM ESPALHAR ÓDIO, MENTIRAS E DIFAMAÇÕES. UMA JUSTIÇA QUE NÃO JULGA QUEM VOMITA MISOGINIA, HOMOFOBIA E RACISMO. NÃO NOS CALAREMOS DIANTE DE FORÇAS QUE HÁ ANOS FAZEM SENÃO ESPALHAR ÓDIO E PRECONCEITO. GENTE TACANHA QUE DEFENDE SOLUÇÕES SIMPLISTAS E ULTRAPASSADAS PARA UMA SOCIEDADE DIVERSA E COMPLEXA. GENTE QUE MIRA À DISTÂNCIA EM MORADORES DE FAVELA E, PUXANDO O GATILHO, FAZ-SE JUIZ E EXTERMINADOR DE SUSPEITOS: EXECUÇÃO SUMÁRIA! GENTE QUE JÁ FALOU E AINDA FALA EM FECHAR O CONGRESSO OU SUPREMO TRIBUNAL. ATIREM EM NÓS! APROVEITEM A OPORTUNIDADE E REVELEM AO MUNDO A VERDADEIRA FACE POR TRÁS DA SORDIDEZ DE SEUS DISCURSOS. FUZILEM. ESTAMOS AQUI PARADOS, NA MIRA. SOMOS UNS TRINTA MIL NA LINHA DE FRENTE, SEM ARMAS DE FOGO, VANGUARDA DE MUITOS QUE NOS SUCEDERÃO APÓS CAIRMOS. SOMOS PACIFISTAS OPOSTOS A DISCURSOS SANGRENTOS E ATITUDES EXCLUDENTES. AQUI EM SÃO PAULO, NA AVENIDA PAULISTA, EM DESOBEDIÊNCIA CIVIL. AO SOM DOS TIROS DE ADVERTÊNCIA E DAS BOMBAS DE DISPERSÃO, NINGUÉM LARGA A MÃO DE NINGUÉM. ELES VÊM, A MANDO DA ORDEM ESTABELECIDA. ELES VÊM… SOMOS UNS TRINTA MIL!
* * *
O extenso discurso, embora fosse um desafio, não oferecia nenhum nome a ser responsabilizado senão o da Pátria. Não havia raiva ou ódio, apenas cansaço e desespero. Diante da tragédia anunciada, uns trinta mil se reuniam na Avenida para denunciar a dureza do discurso majoritário; deixar claro que suas mãos estão sujas de sangue e que a resposta do violento é, por via de regra, a violência.
Eu confesso que essa foi a noite mais escura que vivi. Sonhei, sem nenhum dramatismo, febril e desnorteado por um pensamento obsessivo-compulsivo que me levava a ter o mesmo sonho por horas sem conseguir chegar a qualquer desfecho. Eram uns trinta mil estendendo uma faixa de papel. Era um dia nublado no meu sonho. Eram homens e mulheres de preto, em fila por três quilômetros, estendendo uma faixa de papel pardo com dizeres garrafais em tinta preta.
E a partir desse dia primeiro, sobreviventes ou não, uns trinta mil passam a brilhar contra a maldade.
É isso.
Betim — 10 11 2018
AS FLORINHAS
AS FLORINHAS
Quem lhe imitasse a flor da santidade
E houvesse dos estigmas a sangria,
Dos cravos da Paixão conceberia
O próprio Deus com toda claridade.
E as Florinhas, com mística verdade,
Ao evocar de milagres voz tardia
Revelassem em plena luz do dia
O mistério por trás da Divindade.
Pregando após a pássaros ou peixes,
Logo a glória de Deus rebrilha em feixes
Ao vazar brancas nuvens pelo céu.
E este estado d'errática loucura
Por sua face insã se transfigura
Certo que a própria cruz é seu troféu.
Betim - 12 11 2018
domingo, 11 de novembro de 2018
O CORONEL
O CORONEL
-- "É, menino, eu já fui homem
Duro e acostumado ao mando!
Mas o tempo foi passando
E as certezas todas somem
Aos meus olhos vez em quando."
"Sou um homem vivido.
Conheci belas mulheres
E amoleci nos quereres
De ter sido bem querido
Após muitos malmequeres..."
"Em casa eu tinha uma dona
E filhos que nem escada.
Fora, fazia pousada
N'algum quarto lá na zona
Ou junto a mulher casada."
"Embora morasse na roça,
Pus outra casa na rua
Aonde fosse sob a lua
Visitar formosa moça
E deitar em cama sua."
"Por teúda e manteúda,
Passava o tempo sozinha,
Dizendo-se toda minha...
Já perfumada e desnuda
Quando avisava que vinha."
"Nova, era a minha pequena
Seus beijos, gotas de mel...
Seus olhos, límpido céu...
Seu peito, olor d'açucena...
Seu colo, um nobre pitéu!..."
"A velha em casa notava:
-- "'Tanto apuro no vestir...
Por que sempre um ir e vir?
Por que tanto pernoitava?
Chegava e tornava a sair!"'. --
"Nunca me dizia nada
Mesmo sabendo de tudo...
Entra calado e sai mudo
Quem tem a culpa estampada
Em pleno olhar, sobretudo."
"Vivi, desavergonhado,
Por anos e anos assim.
Até que a pequena enfim
Partiu para outro estado,
Como fugisse de mim:"
"Topei co'a casa vazia...
Não deixou nem um bilhete.
Das roupas, nem alfinete!
Nada mais na sala havia,
Senão poeira no tapete."
"Voltei p'ra roça humilhado,
Sempre a esconder meus ais
De minha dona e os demais...
Hoje, esquecendo o passado,
Na rua eu não volto mais!
Betim - 10 11 2018
-- "É, menino, eu já fui homem
Duro e acostumado ao mando!
Mas o tempo foi passando
E as certezas todas somem
Aos meus olhos vez em quando."
"Sou um homem vivido.
Conheci belas mulheres
E amoleci nos quereres
De ter sido bem querido
Após muitos malmequeres..."
"Em casa eu tinha uma dona
E filhos que nem escada.
Fora, fazia pousada
N'algum quarto lá na zona
Ou junto a mulher casada."
"Embora morasse na roça,
Pus outra casa na rua
Aonde fosse sob a lua
Visitar formosa moça
E deitar em cama sua."
"Por teúda e manteúda,
Passava o tempo sozinha,
Dizendo-se toda minha...
Já perfumada e desnuda
Quando avisava que vinha."
"Nova, era a minha pequena
Seus beijos, gotas de mel...
Seus olhos, límpido céu...
Seu peito, olor d'açucena...
Seu colo, um nobre pitéu!..."
"A velha em casa notava:
-- "'Tanto apuro no vestir...
Por que sempre um ir e vir?
Por que tanto pernoitava?
Chegava e tornava a sair!"'. --
"Nunca me dizia nada
Mesmo sabendo de tudo...
Entra calado e sai mudo
Quem tem a culpa estampada
Em pleno olhar, sobretudo."
"Vivi, desavergonhado,
Por anos e anos assim.
Até que a pequena enfim
Partiu para outro estado,
Como fugisse de mim:"
"Topei co'a casa vazia...
Não deixou nem um bilhete.
Das roupas, nem alfinete!
Nada mais na sala havia,
Senão poeira no tapete."
"Voltei p'ra roça humilhado,
Sempre a esconder meus ais
De minha dona e os demais...
Hoje, esquecendo o passado,
Na rua eu não volto mais!
Betim - 10 11 2018
sábado, 10 de novembro de 2018
SOB PRESSÃO / UNDER PRESSURE
SOB PRESSÃO / UNDER PRESSURE
“Quando RESISTÊNCIA é vaiar as vaias e reafirmar o talento de quem brilha, enquanto os tacanhos se envergonham e nos envergonham”
Para surpresa geral, sessões de cinema a exibir a aclamada cinebiografia do grupo de rock Queen Bohemian Rhapsody (EUA/Reino Unido—2018) não foram notícia pela expectativa dos fãs ou pela pertinência da homenagem ao cantor Freddie Mercury, mas sim pelas vaias e reações homofóbicas que se seguiram às cenas em que o famoso protagonista troca beijos e carícias com outros homens… Os relatos de xingamentos, desaforos, vaias e abandonos nas salas que exibiam o filme ocuparam manchetes em todo o país e mesmo no exterior.
Ainda que tenham sido comportamentos isolados e irrefletidos, duas coisas saltam aos olhos: o desconhecimento sobre o artista cuja vida foram assistir no cinema e, sobretudo—como reflexo dos dias difíceis que temos presenciado—a falta de pudor em manifestar o próprio ódio preconceituoso à afetividade homossexual. Além das palavras de ordem homofóbicas, houve inclusive relatos de manifestações de apoio ao presidente eleito, explicitando se tratar de um ato político e ideológico a postura que defendiam: “Bolsonaro vai pegar vocês!”
Temos andado todos sob pressão. Há um inusitado entendimento de que a vontade da maioria expressa nas urnas dê suporte para toda espécie de agressão gratuita. No entanto, mais do que nunca, percebe-se que tanta raiva contra às minorias na verdade oculta medo. Sim, há exagero no anseio de calar todas as vozes estranhas ao discurso extremista majoritário pela mera constatação de que esse extremismo não suporta o debate. Ou melhor, apenas vocifera cada vez mais alto qualquer bobagem que abafe o ruído dos murmúrios que já se percebem. É por medo de explicitar as evidências de que um bando de despreparados fora eleito para nos governar que nada pode ser contestado.
Afinal, por que temer tanto os perdedores que se reúnem em torno da ideia de RESISTÊNCIA? Razões para ter medo do que virá nós temos, mas, e eles? Eles têm medo de encarar o mito de pés de barro que está diante deles apoiando, pasme-se, a intervenção prévia da Presidência sobre as questões do ENEM! Em nome de quê? Mais homofobia…
Àqueles que pretendem esvaziar a ideia de RESISTÊNCIA é forçoso afirmar que, mais que uma postura de desobediência civil, trata-se antes de sobrevivência. Parafraseando o lema armamentista tão repetido por bolsonaristas: “ódios matam; ideias, não!” Ter medo de ideias de minorias acuadas é a mais perfeita manifestação do quanto eles temem verdades diversas das próprias…
Como não falar em RESISTÊNCIA em face de um estado de coisas que só se degrada à medida que a superficialidade dos discursos se torna a superficialidade das ações? Sob quanta pressão é preciso viver antes que se abra mão do direito à visibilidade homoafetiva e todos homossexuais serem recolocados à força nalgum armário que lhes agrade? Porque os mesmos que vaiaram o beijo de Freddie Mercury são os que agridem na rua dois homens de mãos dadas! A sensação que fica é que não é mais condenável sentir ódio de minorias quando o próprio presidente o externa censurando professores e conteúdo do ensino público.
“Caring about ourselves / This is our last dance / This is our last dance
This is ourselves/ Under pressure /Under pressure/ Pressure”
(David Bowie / Queen)
É isso.
Betim—10 11 2018
sexta-feira, 9 de novembro de 2018
HOMEM DE POUCA FÉ
HOMEM DE POUCA FÉ
Fé, prefiro ter pouca que ter cega.
Quem crê em tudo, vê o que não há
Ou, negando o que vê, logo se dá
Com quem pratica o inverso do que prega.
Antes sua razão a outrem entrega,
Por certo de ir aonde Deus está...
Pois melhor na Verdade que achou lá,
Que quem busca verdades n'uma adega.
Fé, prefiro ter pouca que nenhuma.
Ou melhor, já não ter qualquer certeza
Do que aderir àquela que outro arruma.
Prefiro contemplar a Natureza,
Que só repetir como se costuma,
Regrando da Palavra a subtileza...
Betim - 09 11 2018
Fé, prefiro ter pouca que ter cega.
Quem crê em tudo, vê o que não há
Ou, negando o que vê, logo se dá
Com quem pratica o inverso do que prega.
Antes sua razão a outrem entrega,
Por certo de ir aonde Deus está...
Pois melhor na Verdade que achou lá,
Que quem busca verdades n'uma adega.
Fé, prefiro ter pouca que nenhuma.
Ou melhor, já não ter qualquer certeza
Do que aderir àquela que outro arruma.
Prefiro contemplar a Natureza,
Que só repetir como se costuma,
Regrando da Palavra a subtileza...
Betim - 09 11 2018
ESFEROGRÁFICA
ESFEROGRÁFICA
A pena que desliza sobre a folha
Lhe risque azuis traçados sem desdita.
Com letra antes nervosa que bonita,
Toda a verdade d'alma se recolha.
Cuida em se fazer a cada escolha
A leitura tão fluida quanto a escrita;
Que, frenética, intensa se acredita
A ponto d'estourar-se feito bolha!
Escreve pelo gosto já da tinta,
Violentando-lhe a face do papel
No afã d'expressar-se quanto sinta.
E admira o manuscrito igual troféu
Onde pelo gestual a cor distinta.
Houvesse o azul furtado ao próprio céu!
Belo Horizonte - 09 11 2018
A pena que desliza sobre a folha
Lhe risque azuis traçados sem desdita.
Com letra antes nervosa que bonita,
Toda a verdade d'alma se recolha.
Cuida em se fazer a cada escolha
A leitura tão fluida quanto a escrita;
Que, frenética, intensa se acredita
A ponto d'estourar-se feito bolha!
Escreve pelo gosto já da tinta,
Violentando-lhe a face do papel
No afã d'expressar-se quanto sinta.
E admira o manuscrito igual troféu
Onde pelo gestual a cor distinta.
Houvesse o azul furtado ao próprio céu!
Belo Horizonte - 09 11 2018
quinta-feira, 8 de novembro de 2018
CANTIGA
CANTIGA
Eu te amar, querida, me tem sido
D'uma alegria pura e insuspeitada.
Guarda tu para mim a asa quebrada,
Visto eu arcanjo em sombras decaído…
Se canto co'o alaúde enternecido
Cantiga que deixei inacabada,
É antes porque a lua serenada
Me faz velar-te o sono combalido.
Dorme, meu bem-querer, em dó menor.
Não cuides já se a noite se estender
N'essa pequena morte que é o amor.
Permite que me achegue a te fazer
Doce acalanto até teu trovador
Ao fim, junto de ti, adormecer.
Betim - 12 02 1996
Eu te amar, querida, me tem sido
D'uma alegria pura e insuspeitada.
Guarda tu para mim a asa quebrada,
Visto eu arcanjo em sombras decaído…
Se canto co'o alaúde enternecido
Cantiga que deixei inacabada,
É antes porque a lua serenada
Me faz velar-te o sono combalido.
Dorme, meu bem-querer, em dó menor.
Não cuides já se a noite se estender
N'essa pequena morte que é o amor.
Permite que me achegue a te fazer
Doce acalanto até teu trovador
Ao fim, junto de ti, adormecer.
Betim - 12 02 1996
QUADRADO VERMELHO
QUADRADO VERMELHO
Em óleo sobre tela, era um quadrado
Pintado de vermelho carmesim.
Fora de esquadro, tinha início e fim
Conforme eu me havia revirado.
Era estável, embora algo inclinado
Como abstração platônica de mim,
Que pode o movimento, mas enfim
Permanecia ainda ali parado...
Na geometrização da realidade,
O olho faz reordená-la sobre um fundo
Que distingue a figura à claridade.
Ao que também eu ao olhar profundo
Aproximado em minha humanidade
Saiba me distinguir de todo mundo.
Betim - 08 11 2018
quarta-feira, 7 de novembro de 2018
MALDITOS!
MALDITOS!
Quem são estes cuja luz fora apagada
E, insones, têm nas noites seu refúgio,
Atravessando em vão a madrugada?
Só querem ao poetar vago transfúgio
Da vida d’esperanças comezinhas,
Bem como contra o tédio subterfúgio?
Estes -- que vêm deixar nas entrelinhas
Toda sorte de angústias autorais --
O que buscam por horas tão sozinhas?
Por que se fazem poetas? Por que mais
Buscam tirar das letras o sublime,
Senão por se sentirem sós demais?
Que furtaram aos deuses? Qual o crime
Cometido na aurora dos milênios,
Cuja pena a escrever nunca os redime?
Sem diferir se néscios ou se gênios,
D’onde foi que obtiveram tal saber
Que os obriga a versar entre proscênios?
Como estes que escrevem ousam ler
Nas linhas d’horizonte um sol errático
Por entre arranha-céus a amanhecer?
Como alguém -- entre excêntrico e lunático --
Gastando a vida inteira com escritos
Despidos de qualquer sentido prático?
Malditos! Sete mil vezes malditos!
Estes que têm os versos por oráculo
Havendo além dos céus mais infinitos...
Malditos os que têm pelo vernáculo
Um carinho de artista incompreendido,
Que se imola no altar do tabernáculo!...
Dom às avessas!... Bênção ao inavido!...
À margem das promessas e das glórias,
Poetar é desdenhar o conhecido...
É saber inventadas as memórias
Ou, de belas mentiras, a verdade
Pretendida em suas vãs histórias.
Desastrólogos do alto! Sede, poetas,
Malditos pelos séculos dos séculos,
No augúrio de catástrofes completas!...
Vinde e vede: Reviram-vos d’espéculos
As vossas cavidades buscando alma,
Tal como fazem monges ‘inda séculos.
Terminais por viver tão-só o trauma
Com que fordes há muito amaldiçoados
Com nenhuma paciência e pouca calma.
Facto: Malditos porque mal falados.
Porque muito mal lidos; mal descritos...
Os bons? Somente os mortos, os finados.
Tantos a maldizer-nos os escritos:
-- “Antiquados!! Herméticos!! Absurdos!!!”
Ou sem nem ler (assim assim): -- “Bonitos...”
Se declamamos, fingem estar surdos;
Se publicamos, fingem que são cegos;
Um povo sem país igual os curdos:
Poetas... Filhos de sós desassossegos
Sempre a vagar sem pátria e sem dinheiro,
Indo sobreviver de subempregos;
Ou distante vagando, aventureiro,
Que por entre as palavras em vão erra
Sem nunca encontrar um paradeiro.
Hoje, até Ahasverus possui terra!
No mesmo confim onde Israel governa
E o ismaelita de novo se desterra...
Não os malditos... D’esses é eterna
A caminhada errante vida afora
Atravessando as noites na taverna.
Ali, já sem saber se ri ou chora,
Senta-se e escreve em plena solitude,
Alheio mesmo da hora de ir embora.
Eis dos poetas a glória e a finitude:
Por fim, indiferentes se são lidos,
Já nada nem ninguém ora os ilude.
E ainda que por todos combatidos
Gargalham das desgraças do passado
Enquanto as do presente nos ouvidos.
Mas por fim se revoltam contra o Fado,
Quando entregues à própria escuridão
Caminham co'a miséria lado a lado.
E, d’entre eles, eu: Com talento ou não,
Arrasto estes meus versos qual grilhões,
Sabendo-os meu tesouro e maldição.
Peno eu -- mais três ou quatro gerações --
Amaldiçoando todos no pecado
Que nos predestinou junto aos vilões!
Deveras, parvo e obscuro antepassado,
Pus minha iniquidade sobre os meus,
Uma vez para sempre amaldiçoado...
Antes já natimorto entre os plebeus
Que agora constranger-nos desde o gen
Viver em guerra infinda contra Deus!
Como ignorasse d’onde a bênção vem,
Sem temer me cobrir de pestilências...
Maldito, escolho o mal e evito o bem.
Ao desdenhar de Deus suas violências
Sobre mim e meus tristes descendentes
É que busquei nos vícios experiências.
Uma vez condenado, ranjo os dentes
Urrando contra as hostes celestiais
E a multidão submissa de seus crentes.
Sim, vêm me perseguir feito animais:
Tendo a marca de Caim -- homem de cor --
Com os filhos de Cam eu ergui baais!
Excluído do povo do Senhor,
Sigo a errar d’outro lado do Jordão
Como a face d’opróbrio e do terror:
Quem de longe me vê na imensidão
M’escojura qual visse o deus Moloque
Com chifres a queimar na escuridão!
E vem me apedrejar sem que o provoque
Para que assim me afaste mais ainda,
Pintando-me um demônio sem retoque.
Certo que minha culpa jamais finda,
Aos olhos d’estes homens bons e justos
Convém lhes evitar a terra linda.
Vagando nos desertos entre arbustos
A medo de topar quem quer que seja
E alerta de perigos e outros sustos...
Resta rogar a Deus, por onde esteja,
Que me mate antes qu’eu, de todo aflito,
Devolva ao mundo o mal que me deseja!
Só sei não ver justiça no infinito
Expurgo de más culpas cuja pena
Me faz eternamente ser maldito.
Turvando a vista pela tarde amena,
Como encontrasse Deus um peito ateu
Em ascensão por sobre a luz terrena.
Foi então, do profundo abismo, qu’eu
Tive a visão do fim de tudo e todos
Pós-que o sol trás-às-nuvens s’escondeu.
A noite fez-se eterna nos engodos
D’um extremista, homem de bem ou ambos
Para vencer por todos meios e modos:
Os narcotraficantes com escambos
Mais os supremacistas pelas armas
Contra negros, asiáticos ou jambos...
Seguem todos às voltas com seus carmas,
Fomentando desastres para, enfim,
Ouvir sete trombetas soando alarmas.
Fazem o escatológico festim:
Em celebrações de ódio genocida,
Urgem d’Humanidade o triste fim.
Rudes, vêm vomitar sobre a avenida
Toda espécie d’estúpida revolta
Tendo absoluto horror da própria vida.
Como fossem corcéis à rédea solta!...
Como em carga de audaz cavalaria!...
Vão levando violência à sua volta.
Irmanados na ardente primazia,
Impõem enfim seus males a oprimidos
Embora revestidos de ousadia.
Longe, escuta-se o pranto dos vencidos,
Bem como outros tantos uivos e ais
Já n’um clamor uníssono vertidos:
Partem agora para nunca mais
As utopias d’uma terra justa
Onde, sem males, todos são iguais.
Curvam-se a uma ilusão que nos assusta
Pelo que nos pretende distinguir
Por entre bons e maus à face augusta.
Senhores do presente e do porvir,
Os bárbaros já uivam sob a lua
E clamam por façanhas de se ouvir...
Jactam-se sobre gente seminua
Que vaga pelas sombras da cidade...
E acabara morando em plena rua.
Ameaçam, com toda a propriedade,
Àqueles que muito pouco têm...
Certos de que já donos da verdade!
Pois bodes expiatórios lhes convêm
E as cabeças jogadas contra o asfalto
Mal sobre seus pescoços se sustêm...
Avançam sobre o douto e sobre o incauto
Céleres em calar todas as vozes,
Nos mantendo em constante sobressalto.
Vão vindo como as hordas mais ferozes
Sempre com mais exércitos por trás,
Fazendo correr sangue feito algozes.
Com guerra, vêm impor-nos sua paz
E após jogar na vala mais comum,
Onde pouco importa quem lá jaz.
Milhões vociferando como se um
Os mesmíssimos ódios e violências;
Indo apressados p’ra lugar nenhum.
Esvaziaram as suas consciências
Berram d'olhos vidrados para além,
Indiferentes já às consequências.
Culpa de todo mundo e de ninguém,
Co'as mãos sujas de sangue dizem ser
Maldade contra os maus acto de bem...
Vêm em nome de Deus estremecer
-- Frase após frase infeliz --
Amizades a ponto de as perder.
Clamam todos por Deus n'esse país!
Como o Senhor amasse uns e outros não.
Sem embargo, Ele nada faz ou diz...
Sim, Deus se cala face à escuridão
Que s'estende por sobre a Terra inteira,
E os homens abandona à danação.
Pois nega-se a negar a verdadeira
Razão por trás de tais atrocidades,
Queimando bons e maus pela fogueira.
Permite que a maldade nas cidades
S'eleve finalmente como regra
Acima de quaisquer necessidades.
Desunida, a Nação se desintegra
N'um fundamentalismo evangélico
Que ainda amaldiçoa a pele negra.
Dos generais, de novo o sonho bélico
D'entrar em território fronteiriço
Ou arrastá-lo n'um jogo maquiavélico.
Entrementes, o povo já submisso
Tolera que se mate e se torture,
Como fosse patriota tal serviço.
Mas homem com outro homem configure
Uma abominação contra a Natura,
Onde assassine ou exija que se cure!
E, evocando do Apóstolo a luz pura,
Com Doutrina cristã e militar
S'ensine nas escolas a Escritura.
Se mesmo contra Deus alguém ousar
Ainda escrever seus versos satânicos
Não deixe algum censor os apanhar.
Tempos mudam; as mentes, não... Tirânicos
Os modos de calar a quem escreve,
Enlouquecendo-o com cismas e pânicos.
No mais, nunca se julgue a pena leve
D'este que sempre às voltas com escritos
Tem p'ra si que longa a arte e a vida breve.
Poetas... Se no horizonte d'olhos fitos,
É sabermos ter logo de fugir
Ouvindo a multidão gritar: Malditos!
Betim - 06 11 2018
terça-feira, 6 de novembro de 2018
MALDITOS! n°4
MALDITOS! n°4
Foi então, do profundo abismo, qu'eu
Tive a visão do fim de tudo e todos
Pós-que o sol trás às nuvens s'escondeu.
A noite fez-se eterna nos engodos
D'um extremista, homem de bem ou ambos
Para vencer por todos meios e modos:
Os narcotraficantes com escambos
Mais os supremacistas pelas armas
Contra negros, asiáticos ou jambos...
Seguem todos às voltas com seus carmas,
Fomentando desastres para, enfim,
Ouvir sete trombetas soando alarmas.
Fazem o escatológico festim:
Em celebrações de ódio genocida,
Urgem d'Humanidade o triste fim.
Rudes, vêm vomitar sobre a avenida
Toda espécie d'estúpida revolta
Tendo absoluto horror da própria vida.
Como fossem corcéis à rédea solta
Posta em carga de audaz cavalaria
Vão levando violência à sua volta.
Irmanados na ardente primazia,
Impõem enfim seus males a oprimidos
Embora revestidos de ousadia
Longe, escuta-se o pranto dos vencidos,
Bem como outros tantos uivos e ais
Já n'um clamor uníssono vertidos.
Partem agora para nunca mais
As utopias d'uma terra justa
Onde, sem males, todos são iguais.
Curva-se a uma ilusão que nos assusta
Pelo que nos pretende distinguir
Por entre bons e maus à face augusta.
Senhores do presente e do porvir,
Os bárbaros já uivam sob a lua
E clamam por façanhas de se ouvir...
Jactam-se sobre gente seminua
Que vaga pelas sombras da cidade,
Por moradores d'esta ou aquela rua.
Ameaçam, com toda a propriedade,
Àqueles que muito pouco têm...
Certos de que são donos da verdade!
Pois bodes expiatórios lhes convêm
E as cabeças jogadas contra o asfalto
Mal sobre seus pescoços se sustêm...
Avançam sobre o douto e sobre o incauto
Céleres em calar todas as vozes,
Nos mantendo em constante sobressalto.
Vão vindo como as hordas mais ferozes
Sempre com mais exércitos por trás,
Fazendo correr sangue feito algozes.
Com guerra, vêm impor-nos sua paz
E após jogar na vala mais comum,
Onde pouco importa quem lá jaz.
Milhões vociferando como se um
Os mesmíssimos ódios e violências;
Indo apressados p'ra lugar nenhum.
Esvaziaram as suas consciências
Berram d'olhos vidrados para além,
Indiferentes já às consequências.
Culpa de todo mundo e de ninguém,
Co'as mãos sujas de sangue dizem ser
Maldade contra o "mal" acto de bem...
Vêm em nome de Deus estremecer
-- Frase após frase infeliz --
Amizades a ponto de as perder.
Clamam todos por Deus n'esse país!
Como o Senhor amasse uns e outros não.
Sem embargo, Ele nada faz ou diz...
Betim - 06 11 2018
Foi então, do profundo abismo, qu'eu
Tive a visão do fim de tudo e todos
Pós-que o sol trás às nuvens s'escondeu.
A noite fez-se eterna nos engodos
D'um extremista, homem de bem ou ambos
Para vencer por todos meios e modos:
Os narcotraficantes com escambos
Mais os supremacistas pelas armas
Contra negros, asiáticos ou jambos...
Seguem todos às voltas com seus carmas,
Fomentando desastres para, enfim,
Ouvir sete trombetas soando alarmas.
Fazem o escatológico festim:
Em celebrações de ódio genocida,
Urgem d'Humanidade o triste fim.
Rudes, vêm vomitar sobre a avenida
Toda espécie d'estúpida revolta
Tendo absoluto horror da própria vida.
Como fossem corcéis à rédea solta
Posta em carga de audaz cavalaria
Vão levando violência à sua volta.
Irmanados na ardente primazia,
Impõem enfim seus males a oprimidos
Embora revestidos de ousadia
Longe, escuta-se o pranto dos vencidos,
Bem como outros tantos uivos e ais
Já n'um clamor uníssono vertidos.
Partem agora para nunca mais
As utopias d'uma terra justa
Onde, sem males, todos são iguais.
Curva-se a uma ilusão que nos assusta
Pelo que nos pretende distinguir
Por entre bons e maus à face augusta.
Senhores do presente e do porvir,
Os bárbaros já uivam sob a lua
E clamam por façanhas de se ouvir...
Jactam-se sobre gente seminua
Que vaga pelas sombras da cidade,
Por moradores d'esta ou aquela rua.
Ameaçam, com toda a propriedade,
Àqueles que muito pouco têm...
Certos de que são donos da verdade!
Pois bodes expiatórios lhes convêm
E as cabeças jogadas contra o asfalto
Mal sobre seus pescoços se sustêm...
Avançam sobre o douto e sobre o incauto
Céleres em calar todas as vozes,
Nos mantendo em constante sobressalto.
Vão vindo como as hordas mais ferozes
Sempre com mais exércitos por trás,
Fazendo correr sangue feito algozes.
Com guerra, vêm impor-nos sua paz
E após jogar na vala mais comum,
Onde pouco importa quem lá jaz.
Milhões vociferando como se um
Os mesmíssimos ódios e violências;
Indo apressados p'ra lugar nenhum.
Esvaziaram as suas consciências
Berram d'olhos vidrados para além,
Indiferentes já às consequências.
Culpa de todo mundo e de ninguém,
Co'as mãos sujas de sangue dizem ser
Maldade contra o "mal" acto de bem...
Vêm em nome de Deus estremecer
-- Frase após frase infeliz --
Amizades a ponto de as perder.
Clamam todos por Deus n'esse país!
Como o Senhor amasse uns e outros não.
Sem embargo, Ele nada faz ou diz...
Betim - 06 11 2018
CAÇA ÀS BRUXAS
CAÇA ÀS BRUXAS
Já ardem as fogueiras junto ao templo
Onde à noite se reúnem homens bons.
Querem queimar as bruxas com seus dons
E às moças todas dar devido exemplo.
Expostas, eu atônito as contemplo
Longamente injuriadas nos frissons
D'um juiz a lhes pintar sem entretons,
Ainda qu'ele mesmo contraexemplo!
Culpadas, condenadas e perdidas:
-- "Nem no inferno seriam admitidas!" --
Ouço dizerem seus acusadores...
Terminado, os bons voltam para os seus
Satisfeitos em ter servido a Deus,
Reforçando às mulheres seus pudores.
Betim - 06 11 2018
Já ardem as fogueiras junto ao templo
Onde à noite se reúnem homens bons.
Querem queimar as bruxas com seus dons
E às moças todas dar devido exemplo.
Expostas, eu atônito as contemplo
Longamente injuriadas nos frissons
D'um juiz a lhes pintar sem entretons,
Ainda qu'ele mesmo contraexemplo!
Culpadas, condenadas e perdidas:
-- "Nem no inferno seriam admitidas!" --
Ouço dizerem seus acusadores...
Terminado, os bons voltam para os seus
Satisfeitos em ter servido a Deus,
Reforçando às mulheres seus pudores.
Betim - 06 11 2018
PAZ DE CEMITÉRIO
PAZ DE CEMITÉRIO
Cruzes plantadas pelo campo santo
Nos silenciam sobre aqueles mortos.
Marcam indiferentes aos absortos,
Que vêm lhes visitar com ou sem pranto.
Nomes foram inscritos, entretanto,
Nos madeiros pendendo já meio tortos...
E em jazigos de pedra, com confortos,
Os ricos encontraram seu recanto!
Nenhum d'eles reclama do que tem,
Ao contrário dos vivos que, revoltos,
Cedo ou tarde vêm dar aqui também.
Igualmente, os estúpidos e os doutos,
-- Mortos e quietos como mais convém --
Dormem ora na Paz dos Céus envoltos.
Betim - 06 11 2018
Cruzes plantadas pelo campo santo
Nos silenciam sobre aqueles mortos.
Marcam indiferentes aos absortos,
Que vêm lhes visitar com ou sem pranto.
Nomes foram inscritos, entretanto,
Nos madeiros pendendo já meio tortos...
E em jazigos de pedra, com confortos,
Os ricos encontraram seu recanto!
Nenhum d'eles reclama do que tem,
Ao contrário dos vivos que, revoltos,
Cedo ou tarde vêm dar aqui também.
Igualmente, os estúpidos e os doutos,
-- Mortos e quietos como mais convém --
Dormem ora na Paz dos Céus envoltos.
Betim - 06 11 2018
DEMOCRACIA À SOMBRA DOS FUZIS
DEMOCRACIA À SOMBRA DOS FUZIS
Com a eleição do ex-militar Jair Bolsonaro à Presidência da República, o povo brasileiro passa a conviver novamente com o risco d’um regime autoritário. Pela primeira vez desde a Redemocratização, um governo está sendo composto com generais do Exército e notórios membros do Judiciário, sinalizando para a população um claro divórcio com as classes políticas tradicionais e os movimentos sociais. Ademais, o homem público Bolsonaro se celebrizou declarando, entre outras coisas, a necessidade de grandes mudanças na sociedade mediante o fechamento do Congresso além do elogio ao Período Militar. O quanto esse estado de coisas representa enquanto risco ao processo democrático será visto ao longo dos próximos anos.
Muito tem se discutido nos últimos dias sobre o sentido de ser ou não ser RESISTÊNCIA. Embora o discurso de alguns veja n’essa movimentação o choro de maus perdedores, não são poucos os que observam com preocupação o desenrolar dos fatos. Não se trata apenas o trauma de se perder eleições maculadas com práticas de caixa-dois e manipulação de ambientes virtuais, mas antes a perplexidade diante da agenda conservadora e mesmo superficial que tem sido apresentada à opinião pública. Fala-se em RESISTÊNCIA como forma de demonstrar a insatisfação das minorias que se sentem desrespeitadas e ameaçadas pelas manifestações diárias de ódio e indiferença que se presencia. É RESISTÊNCIA, ainda, a palavra que orienta a reação ao discurso que criminaliza o ativismo de direitos humanos e de justiça social. De fato, o que se percebe no governo em formação é pressa em impor mudanças controversas nas políticas públicas de desarmamento, adolescência, acesso ao aborto legal e segurança pública enquanto as grandes questões econômicas como a privatização de estatais estratégicas e os marcos regulatórios da mineração e do agronegócio são guardados a sete chaves. Em termos gerais, a população se dá conta aos poucos que entregou um cheque em branco a um desconhecido sem muito compromisso com suas reais necessidades. Evidente que sua paciência será curta e as pesquisas de opinião tendem a manifestá-lo com a eventual manutenção da crise econômica e desemprego nos próximos seis meses.
Todavia, esse não é um governo normal. Acertar ou errar em políticas públicas jamais deveria pôr em risco a ordem institucional, o que, aliás, não concorda com as linhas de pensamento já defendidas por esses que agora nos governam. Não se trata apenas de bravatas infelizes contra nosso parlamento ou nosso supremo tribunal. Trata-se d’um modo de se fazer política ao qual nos desacostumamos, isto é, à sombra dos fuzis. Com efeito, às dificuldades normais de se compor maiorias no Congresso vêm se somar a falta de habilidade ou mesmo vontade de negociação que Bolsonaro e os seus têm demonstrado. Além do quê, jamais se deve esquecer quem é o seu vice e como se já impuseram pela força n'um passado recente aqueles que o cercam. Corremos o risco de assistir o futuro governo apagando incêndios com inflamáveis até incendiar o país para que os bombeiros de verde oliva se sintam obrigados a agir... Ser RESISTÊNCIA hoje, mais do que nunca, é defender uma democracia que se encolhe diante de ameaças reais. Urge-nos inteligência e sensibilidade para denunciar sistematicamente as mentiras e contradições dos discursos autoritários, sempre buscando enxergar n’um horizonte mais amplo para onde os manipuladores de plantão pretendem levar a opinião pública.
É isso.
Betim – 06 11 2018
Com a eleição do ex-militar Jair Bolsonaro à Presidência da República, o povo brasileiro passa a conviver novamente com o risco d’um regime autoritário. Pela primeira vez desde a Redemocratização, um governo está sendo composto com generais do Exército e notórios membros do Judiciário, sinalizando para a população um claro divórcio com as classes políticas tradicionais e os movimentos sociais. Ademais, o homem público Bolsonaro se celebrizou declarando, entre outras coisas, a necessidade de grandes mudanças na sociedade mediante o fechamento do Congresso além do elogio ao Período Militar. O quanto esse estado de coisas representa enquanto risco ao processo democrático será visto ao longo dos próximos anos.
Muito tem se discutido nos últimos dias sobre o sentido de ser ou não ser RESISTÊNCIA. Embora o discurso de alguns veja n’essa movimentação o choro de maus perdedores, não são poucos os que observam com preocupação o desenrolar dos fatos. Não se trata apenas o trauma de se perder eleições maculadas com práticas de caixa-dois e manipulação de ambientes virtuais, mas antes a perplexidade diante da agenda conservadora e mesmo superficial que tem sido apresentada à opinião pública. Fala-se em RESISTÊNCIA como forma de demonstrar a insatisfação das minorias que se sentem desrespeitadas e ameaçadas pelas manifestações diárias de ódio e indiferença que se presencia. É RESISTÊNCIA, ainda, a palavra que orienta a reação ao discurso que criminaliza o ativismo de direitos humanos e de justiça social. De fato, o que se percebe no governo em formação é pressa em impor mudanças controversas nas políticas públicas de desarmamento, adolescência, acesso ao aborto legal e segurança pública enquanto as grandes questões econômicas como a privatização de estatais estratégicas e os marcos regulatórios da mineração e do agronegócio são guardados a sete chaves. Em termos gerais, a população se dá conta aos poucos que entregou um cheque em branco a um desconhecido sem muito compromisso com suas reais necessidades. Evidente que sua paciência será curta e as pesquisas de opinião tendem a manifestá-lo com a eventual manutenção da crise econômica e desemprego nos próximos seis meses.
Todavia, esse não é um governo normal. Acertar ou errar em políticas públicas jamais deveria pôr em risco a ordem institucional, o que, aliás, não concorda com as linhas de pensamento já defendidas por esses que agora nos governam. Não se trata apenas de bravatas infelizes contra nosso parlamento ou nosso supremo tribunal. Trata-se d’um modo de se fazer política ao qual nos desacostumamos, isto é, à sombra dos fuzis. Com efeito, às dificuldades normais de se compor maiorias no Congresso vêm se somar a falta de habilidade ou mesmo vontade de negociação que Bolsonaro e os seus têm demonstrado. Além do quê, jamais se deve esquecer quem é o seu vice e como se já impuseram pela força n'um passado recente aqueles que o cercam. Corremos o risco de assistir o futuro governo apagando incêndios com inflamáveis até incendiar o país para que os bombeiros de verde oliva se sintam obrigados a agir... Ser RESISTÊNCIA hoje, mais do que nunca, é defender uma democracia que se encolhe diante de ameaças reais. Urge-nos inteligência e sensibilidade para denunciar sistematicamente as mentiras e contradições dos discursos autoritários, sempre buscando enxergar n’um horizonte mais amplo para onde os manipuladores de plantão pretendem levar a opinião pública.
É isso.
Betim – 06 11 2018
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