sexta-feira, 7 de março de 2025

DISTRAÇÕES

DISTRAÇÕES


Monto um quebra-cabeça de zil peças,

Indiferente à imagem que se forma.

A vida sem sentido se conforma,

Desde que para o Eterno haja promessas.


Talvez a vanidade seja a norma

E me venha a calhar pôr em travessas

Paisagens e pessoas tais como essas,

Ainda que em exígua plataforma…


O interessante — dizem — é distrair-me;

Manter a mente sã e o intento firme,

Em face dos senões da meia idade..


De modo que, querendo ou não, eu vença

Novos jogos sem outra recompensa

Além de suportar a realidade.


Belo Horizonte - 06 03 2025


quinta-feira, 6 de março de 2025

DOMINGUEIRAS

DOMINGUEIRAS No coreto da praça a banda toca Marchas dos carnavais de antigamente. Lampejos do passado no presente, Que à vida provinciana ora evoca. Algo d’aquele tempo traz em troca De saudades passando pela mente, Como andasse de costas para frente Até onde a memória nos coloca. Ingênuas alegrias, dias idos… As canções se confundem nos ouvidos, Enquanto sensações ou sentimentos. Olho e já não sei nem o que é que vejo: Lembranças entremeadas de desejo, Na tarde musical de meus momentos. Ouro Preto - 02 03 2025


terça-feira, 4 de março de 2025

LAMENTAÇÕES

LAMENTAÇÕES


Urjo co'o sem sentido dos acasos,

Indo aonde não sei nem saberei.

N’esse mundo de Deus; sem lei nem grei,

Só tive das pessoas seus descasos.


Poeta, trilhei abismos de parnasos

E nada senão luzes encontrei.

Assim durmo mendigo e acordo rei,

Iludido igual luar em poços rasos.


Talvez ao me construir torres de sonho

Arriscasse a má sorte e o olhar tristonho,

Aprumando pilar a incerto soclo.


Não duvido da queda ou do sinistro

Tantas as crises vãs que administro.

No fim, esta é a vida do caboclo…


Ouro Preto - 02 03 2025


terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

CASARÃO

CASARÃO


Junto do parapeito da janela,

Miro e remiro o largo citadino.

Há n’esse meu mirar algo menino,

Que mais dentro que fora se revela.


Miro e remiro a velha cidadela,

Enquanto ao parapeito escuto o sino.

Há n’esse meu mirar um desatino,

Cujo encanto profundo me desvela.


A lua sai detrás da serrania

E logo a rua toda parecia

Banhada em fantasia enevoada.


Há n’esse meu mirar um bom proveito:

Eu, da janela, junto ao parapeito,

Miro e remiro a noite enluarada.


Betim - 25 02 2025


segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

LONJURAS

LONJURAS


Eu, quando dou por mim, olho as montanhas.

Penso nas caminhadas por veredas,

Que me levem por mais paragens ledas

Ou conhecer além terras estranhas.


Tento entender as marchas e outras manhas

D'aqueles que superam sóis ou quedas,

Sempre com mais ardor do que moedas,

Diante de imensidões tais e tamanhas.


Eu sou eu mais minhas circunstâncias,

Mas hei-de conhecer pelas errâncias

Quem sou em desventuras e aventuras.


Ando para me ver onde antes vi

E estar no que disseram logo ali…

Eu, quando dou por mim, olho as lonjuras.


Betim - 16 02 2025


sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

ÀS ORDENS

 ÀS ORDENS


Estar disponível ao outro, submisso, é próprio do viver em sociedade, tendo outros ao lado e, sobretudo, acima.

Estar disponível a si mesmo, incondutado, é próprio do viver recluso, longe de tudo e de todos.


Oh Liberdade... Teu verdadeiro preço é a solidão!


Betim - 19 02 2025

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

DESREALIZAÇÃO

DESREALIZAÇÃO


Olho em volta e nada é como seria

Ou como deveria… Não me sinto

Parte do que me cerca: Fogo extinto

Em terra calcinada e baldia.


Nada mais cá me serve de valia

E desconfio até do que desminto.

O mundo se tornou algo distinto

Por sob cinzas de vã melancolia.


Eu vejo o que foi feito ser desfeito…

Perco o preciso em face do perfeito

Com risco de não ter nada no fim.


Passo por lacunar ou intransigente,

Pois ando para trás para ir em frente,

Aceitando que tudo é mesmo assim.


Betim - 14 02 2025


quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

LUNÁTICOS, INSANOS OU MELANCÓLICOS

LUNÁTICOS, INSANOS OU MELANCÓLICOS


Em meio a loucos, quem andará são?

Caminho pelo pátio do instituto

Sentindo-me vazio e diminuto

Face àquela angustiante solidão.


Não há agora guardas no portão,

Tampouco grades contra o dissoluto,

Apenas um silêncio resoluto

Atravessa a profunda escuridão:


Por corredores, salas e porões,

Quando na própria mente tais prisões

A segregar uns e outros dos demais.


Em meio a loucos, quem andará bem?

Pareço um mentecapto ora eu também,

Enmimesmado e longe dos normais.


Betim - 24 01 2025


terça-feira, 21 de janeiro de 2025

BORBOLETAS AZUIS

BORBOLETAS AZUIS


Vêm do meio da mata nos saudar

Conforme avançávamos na trilha.

A um só tempo milagre e maravilha,

O azul de suas asas a voejar!


Como se cor que voa ou luz que brilha,

Era de imenso céu ou fundo mar.

Além, nós lhe seguimos o bailar

Onde a beleza em flores se partilha.


Admirados de vê-las e perdê-las,

Enquanto a travessia continua

Lembramos como azuis e como belas.


Ao chegar, caminhando pela rua,

Levaremos do azul das asas d'elas

Uma felicidade nua e crua.


Esmeraldas - 18 01 2025


domingo, 12 de janeiro de 2025

PEDRA DE RAIO

PEDRA DE RAIO

Que estrela cai do céu e rasga o chão?

Uma pedra voadora; ou mais, cadente.

Surge no breu da noite de repente

E luz de canto a canto o seu clarão.


A rocha extraterrestre reluzente

N’um raio a s’espalhar na imensidão…

Foi quase apocalíptica visão,

Como se a própria morte simplesmente.


N’algum lugar alguém há-de encontrar

Qualquer bloco ou fragmento que restar

D’aquele instantâneo assustador.


Então nos lembraremos que o Universo

Ao seu modo aleatório e até disperso

Pode mandar-nos d’esta p’ra melhor.

 

Belo Horizonte - 20 05 2023


sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

COMO NÃO?

 COMO NÃO?


Devo dizer que não. É necessário.

Mais do que isso, eu penso: Imperativo!

Às vezes, afirmar-se é negativo,

Mas responde ao loquaz autoritário.


Eu lhe nego e renego se redivivo

Um sentimento ruim de solitário.

No final, resta o pasmo involuntário

De quem recebe o não e seu motivo.


Ainda que não fosse um despropósito,

Não sou fardo a guardarem no depósito,

Mas, contra o feiticeiro, o seu feitiço!


Devo dizer que não. Sim, acontece.

Mas, compreendido ou não, cá me parece,

Como andasse em terreno movediço…


Betim - 26 12 2024


domingo, 5 de janeiro de 2025

AFORÍSTICO

AFORÍSTICO

Em havendo ou não vida após a morte,
A consciência em mim cá se me diz:
“Quem busca ao fim do dia estar feliz
Intente ser mais sábio que mais forte”.

"Detém sabedoria, por raiz,
Não o que mais saber se lhe comporte,
Sim o que saboreia em sua sorte
Total serenidade face a hostis".

Ignoro quem seja Deus ou como seja,
Mas gosto de sonhar qu’Ele deseja
Saber todas as coisas que sabemos".

"Duvida; desconfia dos doutores
Que entre infernos e céus sonham horrores
Em tudo o que, afinal, desconhecemos".

Betim - 24 12 2024

sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

GOTA A GOTA

GOTA A GOTA


Tamborilava a chuva no telhado 

Enquanto começava a clarear

Co'os olhos s’entreabrindo devagar,

Ressentidos do sono abandonado…


Era ainda um silêncio atravessado

Pelas gotas da calha a transbordar

Por sobre ideias fora de lugar 

E todo aquele alvor de lado a lado.


Imerso n’uma espécie de entressono,

Seguia o batucar hipnotizante,

Livre de desencanto ou desengano


Fora não se sentir senão errante

Na semiconsciência do abandono,

Em quase tudo ao nada semelhante.


Betim - 12 12 2024